quinta-feira, 8 de agosto de 2013

Cena de Caruaru

 Cena de Caruaru
por maneco nascimento

Com texto de Lourdes Ramalho, uma das dramaturgas nordestinas de expressão, o espetáculo “Frei Molambo”, de Caruaru, no Pernambuco, foi apresentado dia 06 de agosto, a partir das 16 horas, no Teatro João Paulo II, na programação do 20º Concurso Nacional de Monólogos “Ana Maria Rêgo” – Ano Lorena Campelo.

(FESTMONÓLOGOS 2013 - Ano Lorena Campelo)


Interpretado por Naldo Venâncio e Direção de Severino Florêncio, o espetáculo se sustenta com maior afinidade na cenografia e luz agressiva branda, sem exceções para gordura saturada no mapa de iluminação.

O texto carrega consigo a qualidade de uma escritora que sabe por onde caminhar. Rico e político, testemunha de acusação dos agravos e defeitos da igreja e seus entornos, por vezes e por vozes, defendido pela personagem narradora, criada pela autora.

(Naldo Venâncio/foto: Brito Jr.)


A Cenografia se espelha, ao fundo, na trindade das cruzes no Calvário e, nas laterais esquerda e direita, escadas em V complementam o ilustrativo da cena dramática. Ainda compõe, ao lado esquerdo, fundo, uma coluna em pira ardendo incenso, incessantemente. O + que caracteriza o convento franciscano, em que o “Frei Molambo”realiza sua obra variável entre serviços ordinários da igreja, praguejos de boca suja e pedidos de perdão ao anjo protetor, sempre que dessacraliza o terreno santo, é um sino e a matraca tirada do saco de surpresas.

O Figurino de franciscano amolambado mantém um cuidado de costuras expressionistas e expostas em falhas do tempo que o caracteriza como o de profeta pregoeiro do deserto.As vestes de voto à pobreza emblematizam o memorial tradicional da roupa marrom, com virtuose de criação conceitual e criativa para justificar o histórico de quem desgastou o hábito andarilho. 

Os elementos de contrarregra, o cajado colorido com fitas da fé nordestina e coroado com uma cabaça, para maior aproximação da cultura popular da herança de sobrevivência nas terras áridas. Os matulões guardam as memórias deslocadas e o saco, com cruz maltada, carrega o pão de cada dia.

Cena barulhenta a partir da repetida inflexão de chamar a atenção do porteiro do convento. O sino da portaria, o frade desloca consigo e metaforiza a carga da casa santa que pareceria seguir com o religioso à construção do drama. No ímpeto de material de zoadas cultuado nas manifestações da cultura popular, uma matraca aparece e, pouco ou mal usada, torna-se um ruído na comunicação, já meio truncada, do intérprete contador da história.

O Texto de prosa poética com margem da literatura de repente, ou rimas tradicionais da poesia do imaginário popular, herdeiras da canção rapsoda e ibérica revisitada, não parece encontrar toda coesão de discurso na voz do intérprete. A prosódia do ator meio que se confunde com perspectiva que busca para a personagem e, nem bem + pesa para o característico do ator, nem se afina ao risco de melhor aproximar-se da fala da personagem que busca conquistar.

Exageros nas inflexões e algumas marcas caricaturais na construção do narrador, acabam arranhando os sentimentos da personagem. A proposta de dramaturgia de cena se esvazia entre o dramático over e o engraçado forçado, perdendo nuances de articulações de palavras em finais de rimas e desmerecendo maior acuidade com o bom humor e ironias inteligentes de Ramalho.

A Luz, que poderia parecer simples, desempenha precisão e define a cena e os signos que precisam ser reiterados na ação dramática. Iluminação suave desce sobre a cruz cristina, e revela os lençóis pendidos, característicos das cores de identidade do cordeiro imolado no madeiro. A que aquece o pecado do frei, toda vez que este ofende o divino, ou quando dorme feito cão aconchegado no calor do fogão à lenha, também tem eficácia significativa. A luz que, vinda das laterais, recorta as escadas em V, valoriza a cena por reproduzir imagem de ostensórios das bordas ao centro do calvário, cobrindo os ladrões que fizeram companhia a Jesus na crucifixão.

A Pesquisa musical compensa o pequeno traquejo do intérprete contador do enredo. Humor fora do característico do texto e atualizações, sem o tempo da piada, acabam por encolher razão e sensibilidade dramáticas e deixando o discurso numa monocordia de lugar comum. 

(Frei Molambo, de Caruaru/foto: Brito Jr.)


Naldo Venâncio, com seu “Frei Molambo”, um devotado esforço de manter a pira acesa, mas a fé cênica se apresenta caolha. Ainda que com um olho só, ou cegueira total, se possa realizar arte com ouvidos de morcego, nessa experiência teatral o frei, de Naldo, não genuflexionou em oração completa. Ficou a dever oração + fervorosa de arte do ator. 

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