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[Um palco de urgências
USP
organiza I Bienal Internacional de Teatro com o tema “Realidades Incendiárias”
TAGS: 66 minutes em Damascus, BadenBaden, I Bienal Internacional de Teatro da USP, Realidades Incendiárias, Teatro, The Island, TUSP
Mariana
Marinho
Em
"66 minutes in Damascus" o público é posto no lugar de um grupo de
turista que visita a capital síria. "66 minutes in Damascus",
montagem do diretor libanês Lucien Bourjeily. Foto Elcio Silva.
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Durante
quarenta e cinco dias, inquietações e tensões de diversas partes do mundo irão
se cruzar na I Bienal Internacional de Teatro da USP. Com o tema “Realidades
Incendiárias”, o festival traz para a capital paulista
peças que colocam em cena, de forma arrojada e inusitada, as fricções de
universos marcados por relações conflituosas: em 66 minutes em Damascus,
do diretor libanês Lucien Bourjeily, por exemplo, é possível vivenciar a situação
de conflito na Síria; no espetáculo da Cisjordânia, The Island, por
meio da história vivida entre dois companheiros de cela é explorado o drama da
era do apartheid; já em BadenBaden,
montagem do Coletivo Baal, de Florianópolis, inspirada no texto de Bertolt
Brecht, é posta no palco uma espécie de
prenúncio do nazismo.
(espetáculo "BadenBaden", do Coletivo Baal[Florianópolis/Santa Catarina]/foto Lucas Heymanns)
A
escolha dos espetáculos – cinco internacionais e quatro
nacionais –, levou em consideração os temas mais caros à juventude
contemporânea e a proposta estética das montagens. São artistas e
companhias que apresentam uma trajetória ímpar e amadurecida, porém, pouco
conhecida no Brasil, no caso dos grupos internacionais, e em São Paulo,
pensando nas produções de Florianópolis e Minas Gerais.
“O
título ‘Realidades Incendiárias’ é uma tradução de nossa própria percepção
sobre esses trabalhos. Percebemos que havia uma urgência desses jovens em falar
de suas realidades. Evidente que são realidades muito diferentes, com conflitos
e incêndios distintos entre si, mas todos esses grupos estão dispostos a
trazer, de algum modo, as inquietações de suas vidas para suas obras”, explica
Deise Abreu Pacheco, que coordena a curadoria da Bienal, composta por
Ferdinando Martins, Maria Tendlau e René Piazentin.
Teatro
como diagnóstico do presente
Ferdinando
Martins conta que a equipe organizadora pôde realizar seu trabalho de forma
bastante livre durante um ano e meio de preparação. “Fizemos toda a Bienal
apenas com o recurso da própria universidade. Isso nos proporcionou uma
liberdade absoluta de escolha dos espetáculos que dialogam com o tema que, na
época, nós imaginávamos ser interessante. Hoje, depois das manifestações de
junho ,vemos como foi uma escolha bastante acertada”, diz.
Para
ele, o teatro tem despontado como linguagem responsável por fazer os
diagnósticos do presente, assim como fez a
literatura no século XIX e as artes visuais na primeira metade do século XX. “A
escolha das peças acabou formando um mapa geopolítico não por acaso: ele se deu
via teatro porque as pessoas do meio estavam mais sensibilizadas para esses
acontecimentos”. René Piazentin acredita que parte dessa condição do teatro
esteja ligada à interdisciplinaridade, fenômeno de sua natureza, e à ideia de
criação coletiva, processo cada vez mais comum na cena teatral de todas as
partes do mundo.
Deise
Abreu Pacheco pondera. “Não acho que o teatro seja a arte que trará uma
bandeira de renovação, de grande transformação no campo artístico”. Entretanto,
a curadora acredita que existam situações históricas capazes de favorecera aura
de arte pulsante do teatro. “Em São Paulo, isto está favorecido pela luta da
classe teatral, que nos últimos 15 anos, com o teatro de grupo, acabou
conquistando alguns caminhos – não sem bastante contradição, haja vista toda a
problemática política inserida em nosso DNA. Nesse sentido, o teatro vem tendo
uma posição, digamos, de frente de batalha artística e política, mas ainda tem
muita coisa para andar”, comenta.
Entre
as batalhas que o teatro ainda deve travar está, para Ferdinando Martins, a
luta pela formação de público. “A linguagem está tão antenada e o público está
sumindo? Sim. Porque, de outro lado, temos um processo de idiotização da
sociedade, em que o público já não consegue se ver nos espetáculos ou se
incomoda de estar refletido nele. O mundo inteiro reclama da crise do público
no teatro. Claro que é uma crise com proporções: em São Paulo ela é muito mais
grave do que na Argentina, por exemplo”.
No
caso do Brasil, Deise Pacheco defende que o estado deve garantir que todos
tenham acesso às regras do jogo: “as pessoas não gostam de teatro
porque elas não entenderam como se joga. Para que a linguagem seja
democratizada é necessário que todos conheçam seus códigos. Como vamos esperar
que uma população que não tem acesso a sua própria cultura pode,
simbolicamente, ter acesso ao teatro, que é o suprassumo da
linguagem?”. “Porém, acho que há esperanças por meio de iniciativas como a
Bienal e outras tantas que podem favorecer essa partilha de linguagem”,
continua.
René
Piazentin acrescenta que, hoje, a sensação é de viver o resultado de um
processo que sempre pensou o cidadão ideal como um sujeito bem comportado que,
preferencialmente, sai do trabalho, se dirige até sua casa, liga a televisão e
pronto: tudo resolvido. “Por que me submeter a uma cidade que não me dá
sensação de segurança, a um espaço público que não sinto como meu, a um
trânsito caótico? Pensando em todos esses fatores, quando você olha para uma
platéia de trinta pessoas você pensa ‘nossa, tudo isso?’. Não deixa de ser uma
vitória, o que, por um lado, é triste”.
“Lembro
de uma conversa que tive com René via Facebook, em 2011, enquanto estava no
Irã. Eu disse: as peças, aqui, ficam em cartaz quatro meses e fazem quatro
sessões durante a semana e quatro durante o final de semana. Esse é o padrão. O
René me respondeu: se você disser que tem público, eu corto os pulsos.
‘Pagante’, eu respondi”, ri Ferdinando Martins. “Lá, apesar da repressão, há
uma cultura voltada para o teatro. Lembro de um diretor me dizer: aqui, ator
não fica desempregado. Pode ganhar mal, mas desempregado ele não fica”.
Modalidades
paralelas
Além
das montagens a programação da Bienal prevê outras modalidades em torno do tema
“Realidades Incendiárias”. São elas: Roda de Espectadores, nas quais o público,
comandado pelos pesquisadores Flávio Desgranges e Giuliana Simões, poderá
discutir os temas das peças em cartaz; Partilhas Incendiárias, apresentações do
projeto de artistas participantes da Bienal; Curtos-circuitos, espaço destinado
ao encontro entre os diretores e grupos, workshops de dramaturgia, com a
presença da encenadora e autora inglesa Lisa Goldman e do dramaturgo
argentino Santiago Serrano; e workshops com os diretores Lucien Bourjeily, do
Líbano, Vicente Concílio, do Brasil, Oliver Flijc, da Croácia e Lotfi Achour,
da Tunísia.
I
Bienal Internacional de Teatro da USP
Quando: até 15 de dezembro
Programação completa: www.usp.br/bienaldeteatro/]
Quando: até 15 de dezembro
Programação completa: www.usp.br/bienaldeteatro/]
(FONTE: por
Marinho, Mariana. Um palco de urgências/revistacult.uol.com.br)
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