quarta-feira, 27 de maio de 2015

Memória Vívida

Histórias da cidade
por maneco nascimento

Teresina nasceu em fins dos anos oitocentos, do século XIX de Nosso Senhor Jesus Cristo, sob os auspícios de mudança da capital a local que melhor desempenhasse os negócios e comércio a uma capital da Província do Piauí e retirasse o centro do poder de uma cidade do interior, cravada no sertão piauiense e, considerada pelo então Presidente da Província, Conselheiro Saraiva, como inapropriada para a manutenção das coisas do governo.

+ às margens dos rios, um vindo do norte fronteiriço com o Ceará (onde nasce o Rio Poty) e outro deslizado em geografias do sul do estado provincial, de terras do Goiás (o Parnaíba) ao Piauí. As águas se encontravam na zona da mata que, na modernidade, tornou-se zona norte de Teresina.

Rios que hidratavam terras e corriam por logradouros nativos e caminhos das subsistências que, naturalmente, impunham a formação de aldeados e povoamentos ribeirinhos. Nessa terra de proximidade do encontro dos rios é que foi feita a escolha feliz de assentamento do primeiro canteiro da nova capital.

O Rio Parnaíba, em sua navegabilidade, seria um escoadouro de mercadorias vindas do interior sul, que chegariam ao centro da futura capital. Trazida a produção das vilas e cidades, crescidas no eixo ribeirinho, ou próximas dos caminhos das águas, ao vetor da modernidade que seria instalada na Vila Velha do Poty e + adiante Vila Nova do Poty. Para fugir das epidemias tropicais advindas com os alagamentos das temporadas de chuvas de verão, a cidade subiu a terreno + elevado e assentou canteiro de construção na Chapada do Corisco.

A nova capital instalou-se nos limites do entre rios (a primitiva geografia teresinense alcunhada de mesopotâmia nordestina) e, nos dias de hoje, cresce para fora destes. Plantada, à época, a segunda capital com casas oficiais e sede do Governo em local próximo, também, de matas ciliares e babaçuais que seriam matéria prima aos improvisos da emergência de construção de moradias e vida da Vila.

O tempo de adaptação e acomodação instaurou a ideia de construção de cidade planejada, o tabuleiro de xadrez que recebeu a Teresina, esta com nome criado em homenagem à Imperatriz do Brasil, Teresa Cristina.

Dos dias dos oitocentos do século XIX, ano 1852, aos que atualizaram Teresina ao século XX, já com vida comercial, industrial, sócio cultural e política definida, em seu esteio de crescimento e modernidade conquistados, a cidade planejada tomou ares de província organizada e, defendida por seus herdeiros naturais daquela Velha Vila, pensada a princípio às margens do Poty, e que se transformou na charmosa capital, recortada em memórias de Genu Moraes a registros insuspeitos no livro “Genu Moraes – a Mulher e o Tempo”, com depoimentos concedidos a Kenard Kruel.

(Dona Genu e seu Livro em mãos/foto: K. Kruel)

Anos dourados de trinta, quarenta, cinqüenta e alhures trazem novidades sob o olhar atento e curioso da jornalista, política e senhora da sociedade local em construção permanente e dinâmica. Os guardados de memória e experiências vividas são motes de revelações e novidades da construção social piauiense na pena da contadora de histórias à história do Estado.

Das primeiras construções à instalação da sede do Governo provincial, em 1852, aos anos quarenta do século passado, uma coisa em comum. Naquela era primordial, construções a princípio foram feitas a partir de casas de palha.

Nos anos quarenta, ainda havia na cidade muitas casas de palha e que foram geradoras de um dos piores infortúnios registrados. Momentos por demais infames aos moradores de bairros nascidos no entorno do velho centro da Teresina, do Estado Novo, e das perspectivas de belepoquismo, à imitação do Rio de Janeiro, capital federal e sede irradiadora do poder ditatorial de Getúlio Vargas.

Teresina, na década de 40, era ainda uma cidade pequena. Contava com cerca de oitenta mil habitantes. Não havia subúrbio. Compunha-se de poucos bairros. Tínhamos as chamadas ruas centrais, como São Pedro, São José (hoje Rua Félix Pacheco), Santo Antônio (hoje Rua Olavo Bilac). Todo esse espaço, inclusive próximo ao Largo das Dores (Praça Saraiva), era preenchido por casas de palha.
Os proprietários alegavam que a cobertura de palha era proteção para o calor intenso da cidade, mais forte entre os meses de agosto a setembro. Havia quatro mil casas de alvenaria contra doze mil e setecentas de palha, uma encostadinha na outra. Um perigo a céu aberto. Então, os incêndios criminosos começaram em nossa cidade, atingindo as casas localizadas na periferia, em bairros como o Cajueiro, Vermelha, Piçarra, Mafuá e Matinha. Papai acusava o major do Exército Evilásio Gonçalves Vilanova de ser o mandante dos incêndios (...) Papai dizia que o major Evilásio Vilanova era a vingança da cidade de Caxias, no Maranhão, contra Teresina, que se tornou a capital porque Saraiva queria fazer frente ao comércio de Caxias e Oeiras ficava dentro de um buraco, imprestável para o desenvolvimento do Estado (...) possuidor de um caráter frio e sanguinário. Tinha um sarcasmo muito grande ao falar. A característica se manifestava mais fortemente quando estava interrogando alguém importante. Mantinha uma vigilância acentuada sobre toda a cidade teresinense. Seus ‘olhos’ e ‘ouvidos’ estavam em todos os lugares através dos ‘secretas’ que se posicionavam  em lugares estratégicos, como o Bar Carvalho, um corredor entre as lojas Sady e Diacuy Variedades, e Café Avenida (...)” ( Kruel, Kenard. Genu Moraes – a Mulher e o Tempo. Teresina: Zodíaco, 2015. 608 p. [Os incêndios em Teresina, pgs. 363, 365, 367])

Genu retrata com cuidadoso detalhe de memórias, as histórias que ouviu, acompanhou e foi testemunha presente, como boa jornalista que era, dos sinistros que inflamaram bairros e expulsaram famílias pobres para locais + afastados do quadrante e entorno do centro da cidade e, acabaram obrigando a quem detinha posses e casas, terrenos e moradias à base de palha, a construir novas edificações com materiais + apropriados a novo cotidiano e imagem da cidade, nestes locais vítimas de incêndios criminosos.

 “O major Evilásio Vilanova trouxe para ajudá-lo em sua sanha assassina a Adalsina Barcelos de Carvalho, uma perita em explosivos, logo denominada de Gaúcha, por ser branca e loura. Os soldados colocados a sua disposição passavam o dia enrolando pedacinhos de papel com pólvora dentro, que eram, de madrugada, amarrado nas pontas das palhas das casas dos infelizes. É por isso que os incêndios se davam mais entre uma e três da tarde, quando o calorzão do sol esquentava a pólvora – que faiscava e provocava o fogo.  A gaúcha foi tomada de amores por Domingo de Carvalho, guarda civil, seu cúmplice nos incêndios. Ambos foram presos em flagrante, em 1941, pela Força Federal quando estavam amarrando os papeizinhos nas pontas das palhas das casas. Mas, por influência direta do major Evilásio Vilanova, foram transferidos para o quartel  da Polícia Militar , onde receberam tratamento vip, tendo direito a pão, manteiga e bebidas finas. Que destino tiveram? Avionaram para longes terras,  por conta do major Evilásio Vilanova. O processo foi, rapidamente arquivado. Nunca soubemos do paradeiro do casal. Numa ação para despistar a opinião pública, o major Evilásio Vilanova mandou prender, entre outros “Filhos de Ninguém”, o leiteiro Lídio e o Luís Enfermeiro para que, sob tortura, assinassem termo incriminando o Dr. José Cândido Ferraz como mandante dos incêndios, mas eles disseram que podiam morrer, mas não mentiriam (...) O motivo da raiva que o major Evilásio Vilanova nutria por Dr. José Cândido Ferraz, além da história da filha Marísia, era em razão de ele bater fotos dos incêndios e publicar reportagens nos jornais do Sul, acusando-o de ser o verdadeiro mandante do crime (...)”  (Kruel, Kenard. Genu Moraes – a Mulher e o Tempo. Teresina: Zodíaco, 2015. 608 p. [Os incêndios em Teresina, pags. 367, 368, 369])

“Genu Moraes – a Mulher e o Tempo”, o livro, será lançado nesta sexta feira, 29, em homenagens que ocorrem no Theatro 4 de Setembro, a partir das 18 horas. Entre as atividades confirmadas, apresentação do espetáculo de dança teatro “Ela – Tributo a Genu Moraes”; Lançamento da Obra de memória e história da construção social piauiense, sob a ótica de Genu Moraes; Inauguração do Espaço Cultural Café Literário “Genu Moraes”; Exposição Fotográfica “Genu Moraes”, por Valdyr Fortes, e Sessão de Autógrafos.
(Genu em elegância Formidável/reprodução)

Ninguém poderá prescindir da Obra em questão. É um registro de memória viva e bastante representativo dos anos relatados pela jornalista e autora, Genu Moraes, à memória e história de Teresina e Piauí para mote de política, poder, família e cultura memorados.

Serviço:
18h - Espetáculo de dança teatro "Ela - Tributo a Genu Moraes"
19h - Lançamento do livro "Genu Moraes - a Mulher e o Tempo", de Kenard Kruel
         Inauguração do Café Literário "Genu Moraes" 
         Exposição de Fotografias "Genu Moraes", por Valdyr Fortes
         Sessão de autógrafos.
dia: 29 de maio de 2015
local: Theatro 4 de Setembro
Entrada Franca!

fotos: Genu (acervo pessoal)
          Genu e sua Obra (Kenard Kruel)
          Cartaz (arte Tupy/acervo João Vasconcelos)

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