terça-feira, 2 de outubro de 2012

A(h)Lice! Não mora ainda aqui.

 A(h)Lice! Não mora ainda aqui.
por maneco nascimento

No último sábado, 29, no palco do
 Theatro 4 de Setembro, a Cia. Teatro da Tribo, de Franklin Pires, reapresentou sua versão de “Alice no país das maravilhas”, baseada no original de Lewis Carrol. A partir das 17 horas, o público infantil e pais acompanhantes receberam uma montagem muito interessante desse clássico universal para pequenos.

A cenografia é funcional com painel ao fundo que emblematiza o mundo encantado ao qual a
 menina Alice é transportada para viver uma aventura extraordinária. Ainda complementa a cenografia as árvores que premeditam uma 3D e um relógio a la estética surrealista de Salvador Dali. A luz também adquiriu, desde a estreia, uma sobriedade que parecia ainda patinar àquela data. 

Os figurinos e adereços têm o apelo infantil e o cuidado de permanecer entre o real e o imaginário para público infantil, sem perder a magia e o encanto necessários à obra tão visitada e sempre sujeita a expectativas e comparações com a imortalizada versão do cinema. Franklin Pires realiza uma versão textual fiel e uma direção enxuta, inteligente e, seguramente, pragmática para convencimento e atração das crianças.

O prólogo ocorre no procênio, com cortinas fechadas, para o encontro da menina com o coelho apressado e responsável pela descida da menina ao reino encantado.
 F. Pires divide-se entre o Coelho do relógio, o Gato de sorriso enigmático e o Chapeleiro maluco. Consegue concentrar estilo próprio e cuidado em economizar fingimento para distanciar personagens tão próximos na fantasia dramática.

Luciano Brandão e Márcio Brito se desdobram nas vezes dos Gêmeos (muito engraçados), as lebres do encontro para o chá e os Guardas do exército de cartas da Rainha, que resumidos em duas cartas de espadas dão uma graça particular de solução cênica para leitura épica.

Nayara Fabrício compõe a Lagarta, a Borboleta libertada do casulo e a Rainha do mundo de cartas de baralho. Também tem uma eficiência prática para enredo tão enxuto e de soluções à dramaturgia de cena muito regular. 

A montagem não deixa brechas para a criança desconcentrar.
 Mantém uma energia equilibrada sem querer parecer “of Broadway”, mas sem também apontar teatro franciscano. Tem medida infantil.

Gleyciane Pires, a atriz que veste as roupas de Alice, parece ainda não ter aprendido a lançar-se ao abismo em busca de sua ostra. Sem descobrir o canteiro de ostras não conseguirá armazenar a pérola da fantasia necessária ao universo do fingimento. Como a peça exige desdobramento de intérprete à personagem da trama que leva o nome da protagonista, G. Pires precisa correr atrás do prejuízo.

Há uma verdade brincada e prazerosamente encontrada em
 F. Pires, L. Brandão, M. Brito e N. Fabrício, mas um artificialismo de entrega, uma dinâmica descomprometida, talvez por falta de compreensão, na atriz G. Pires. 

O texto na boca da atriz sai numa neutralidade que nem passa pela naturalidade premeditada, nem pela escolha conceitual da intérprete, ou diretiva do encenador.
 É + um esforço em atender a um chamado para algo que parece não estar convencida de realizar. O intérprete não convencido da cena, não convencerá a ninguém muito menos.

A peça tem calor inteligente de dramaturgia premeditada que
 perde força nos textos da Alice de Gleyciane. O carvão abanado ganha calor e vai perdendo a energia nas intervenções da atriz de Alice franklinpireana. + sabatina no texto de inflexões emboladas e um chacoalhar na idéia de interpretação de G. Pires talvez encontrem a pedra de toque que falta ao conjunto de tão significativa montagem.

Alice no país das maravilhas” não está no grupo nem de montagens infantis locais caça níqueis, nem das que esperam resolver os problemas quando Deus quiser. Está no tempo certo de entreter, divertir e atrair a atenção infantil. Detém qualificado mapa de linguagem ao público infante, sem querer aplicar pedagogia de dramaturgia voltada a excitar os pequenos.

Salvo o desnível de crença, que parece existir na atriz e que impede o domínio da grande personagem que é Alice, o espetáculo está no caminho certo para coelhos, gatos, lagartas, lebres, rainhas, gêmeos, chapeleiros malucos e guarda real. Agora é só reunir energia inteira e ganhar a fantasia. 

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