sexta-feira, 9 de novembro de 2012

Flor ditada


Flor ditada
por maneco nascimento


Nesta última quinta feira, 08 de novembro de 2012, fechando o certame de concorrência ao XIX Festival Nacional de Monólogos “Ana Maria Rêgo” – Ano Adalmir Miranda, o Theatro 4 de Setembro recebeu, no tablado, uma nova invenção de Dona Margarida, às 20 horas.

Apareceu a Margarida”, de Roberto Athayde vem, na esteira do deus-Exmachine, revelar Michelle Ferreira, uma jovem mineira que realizou um sonho de montar umas das + visitadas peças da dramaturgia nacional. Com direção de Camilo Lélis, o texto de Athayde recebeu adaptações e atualizações do Grupo Flores de Jorge Cia. Cênica e facilitou o aparecimento de Michelle e sua flor de tirania escolástica.

A novidade veio dar à cena, na qualidade rara de “serei a nereida”, no paradoxo de atrair a atenção da classe (público) e confirmar o desejo e a vontade de manter a plateia fiel à tirania da professora tradicional que se utiliza dos artifícios da lição ditada do aparelho reprodutor de pedagogias de dominação, seja da cultura oficial, ou da contra cultura crítica.

da sedução e a chantagem, passando pela demagogia até a repressão aberta, para maltratar a sua turma de alunos e envolvê-los no seu universo de desvario. O despotismo da personagem vem sendo tratado, desde então, como figura de linguagem para falar de todo regime de dominação, sobre as questões concernentes ao poder, tendo a sala de aula como microcosmo desta sociedade disciplinar; o banco escolar como primeiro estágio para o adestramento.” (release)

Cenografia eficaz, para dramaturgia de metalinguismo do didático e pedagogismo ilustrativo, vem abocanhando força no desenrolar da narrativa de Dona Margarida, de Michelle Ferreira. Os signos e lições escolares que surgem das távolas de exercício de aprendizagens já elaboram uma dinâmica da pedagogia da cena propositada. Beber a água do vaso de flores, uma ironia entre o escatológico e o louco perspicaz que aciona vida a objeto que poderia ser mero sinal composicional de contrarregra.

A luz de D. Margarida vem reforçada pela Iluminação dramática que desenha o caos e a redenção do caos da personagem lançada às feras. Aquece e (des) mistifica a cena e a intérprete em metodologia de encenar. O Figurino funcional e de estética direcional ao discurso intrínseco e dominador, numa maquiagem de parecer de neutralidade de cor, quando na verdade se impõe para leitura contextual de céu cinza de condor, ou de sala de aula de conteúdos impositivos.

Michelle Ferreira constrói uma Margarida econômica, sem os impáfios da literalidade, ou rubrica textual original e segue numa postura entre o falso dócil e a violência freada pela composição, talvez aproximada + da docilidade da atriz. Não parece haver qualquer ingenuidade, de escolha da montagem, na cartografia de definição dramática. Aparenta deslizar pelo tênue e sóbrio percurso de fugir do lugar comum e caricatural da densidade violenta de D. Margarida e, essa escolha, por vezes, não consegue dominar “o aluno (a)” de natureza resistente a qualquer imposição superior de ordem e regra.

Os solilóquios e silêncios, na metacena, construídos para reforço da falsa delicadeza e ministério da coerção da Margarida, de Michelle, agregam o corpo e fala da personagem em conluio permitido com a intérprete impregnada pela paixão da própria cena, em apropriados esquemas da dramaturgia possibilitada pelo esforço da Flores de Jorge Cia. da Cena.

Uma atriz de estatura mediana que vaza uma Margarida, filha de Dona Margarida, de Athayde, e cresce em força e magia do teatro, para efeitos de lúdico e outros estratagemas do ciclo rotacional dramático.

Michelle Ferrreira, sem sombra de dúvida, atracou na praia certa e, às vezes da sereia de Gilberto Gil, em mundo tão necessariamente desigual, deverá sofrer antropofagia, mas também saberá, como Piaimã, engulir seu público e preservar a pedra muiraquitã para toque teatral.

2 comentários:

  1. Maneco, muito grata pelas considerações! O "pulo do gato" do espetáculo é cada apresentação ser única, cada público responde de um jeito completamente distinto e isto nos alimenta enquanto atriz.

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  2. estamos no caminho certo. ser ator/atriz é sempre correr riscos. riscos de manter o teatro vivo. Parabéns pelo seu trabalho. sua margarida tem a força que alimenta o teatro, arte de se reinventar o teatro.

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