segunda-feira, 29 de fevereiro de 2016

Lição de aprendiz

O poeta planador
por maneco nascimento

Numa semi(meia)lua superior “a lá arco íris”, bebendo à fonte, despencada do céu esquerdo ao chão direito , do meio ao canto direito do papel, surge  a imagem  iconógrafa das letras em risco de sutil, simples e direta poesia [precisoserimprecisosepreciso] (pag. 48), assim mesmo, xipofagados os fonemas, morfemas, palavras expressas no pragmático poético.

São “Influências” do [Ré   pente Lá   tente] (pag. 46) presas na escala de sol, transversalizando poesia e música, em notas que sonorizam a força do eu poético, que canta e conta, num trocadilho feliz, o aparente comum, mas que rima o constructo frasal e de lírica moderna e livre.

[Voar agora/Seria a solução./Sair pela janela/Com asas de avião./Num voo livre,/Leve, pelo céu./Sem rumo./Asas de papel.] (Morais Júnior, José Machado de. Aprendiz de Planador. Teresina: FCMC, 2015. 86 p.{Aprendiz de Planador, pag. 15})

E, [Com meu sonho de chegar ao sol em pedaços,/Eu, Ícaro, refaço minhas asas todo dia, ao acordar./Espero que o vento sopre a calma na minha cara devagar/E que o meu amor seja mais leve que o ar./Hoje vou voar pra te encontrar./Amanhã nem sei,/Como/Eu/Serei/Quando/O/Sol/Chegar] (Mais leve que o ar, pag. 16)

Como bom poeta e de composições musicais e publicitário, Machado Júnior sabe brincar com as palavras e vender o peixe, fresco, de guelras rubras, e com cheiro de saído “agorinha do anzol”. Salta para o vazio, preenchido de presenças e palavras e brinquedos linguísticos, com humor e inteligência aplicada ao poético.

Brinca com um brinquedo, de toda memória afetiva de criança, o planador de papel, e em voo de liberdade leve, aspira que sua solução de fantasia, de realidade infantil, leve ao céu as asas de papel.

Revira mitos e, ao ascender ao sol de Apolo, às vezes do mortal Ícaro, desconstrói asas que vicejam pelo sono e, a cada dia morto e ressuscitado, voa ao encontro da amada, pois que seu amor romântico, mais leve que o ar sonha por hoje, o amanhã pertence ao Sol, que de precipício, à queda ao alto, inspira-se mito do eterno retorno aos céus do Sol.

Machado é assim, Aprendiz de Planador, em obra homônima, diz a que veio. Ao veio poético que o guarda, aguarda, cala, fala e arrisca um fazer de poesia. E, para hai-kais de ocidente livre conspira, [Sou o amor./Vivo e morro/Quando o mundo diz: TE AMO!/Eu, amor, nasço de novo.] (Sou o amor, pag. 17); [Somos de alguma maneira/Eternos namorados/Até quarta feira.] (Carnaval, pag. 21); [(UNI) VERSO (IN) PESSOAL./POEMA SINGULAR/DE UM HOMEM PLURAL.] ([Uni]Verso, pag. 23)

E, ainda, [Licença Poética É A Cura/Com O Perdão Da Palavra,/Para A Doença Da Censura] (Com Licença..., pag. 26); [Dilua a lua/dissolva o sol] (Noite e Dia, pag. 29); [Qualquer coisa a gente toca./A gente canta./A gente come música./Almoço e janta.] (Nossa música, pag. 35); [Você veio/E visitou meu coração a passeio.] (Você veio, pag. 37); [Seus olhos parecem não ter fim,/Seus olhos me olham.../...Muito além de mim.] (Seus olhos parecem não ter fim, pag. 38); [Com o sol na cabeça/Digo ao dia:/Cresça e apareça!] (Com o sol na cabeça, pag. 39)

[Doutor, poesia é doença?/Só para quem não pensa.] (Doutor, poesia é doença?, pag. 40); [Com os dedos em riste/O poeta insiste/E sua poesia existe.] (Com os dedos em riste, pag. 42); [Na/Bala/Tudo/Muda./Na/Hora/Muda/Fala.] (Na Bala, pag. 45), o poeta apropria-se do humor cáustico dedicado ao mudo(a) e, num intertextual recolhido do popular, gera poesia.

 [Amor meio quimera/Um dia achei que fosse./No outro já era.] (Amor meio quimera, pag. 74); [Em vez de palavras mudas,/Mudas de palavras.] (Pé de Poesia, pag. 77); [Antes do sol se por/Abelha beija flor] (Antes do sol se por, pag. 82); [Às vezes/Falo./Às vezes/Grito/Às vezes/Calo...] (Às vezes falo, pag. 84) e [Você nem sabia/Que nossa amizade/Virou poesia.] (Você nem Sabia, pag. 85)

Ao sensual e sexual, reflete o que latente e quente e pulso de desejos, [Quando me vi estava teso,/Pedaço de pau./Quando me vi estava preso,/Homem animal./Quando me vi estava aceso,/Pleno carnaval./Quando me vi era um bicho/Plural] (Espelho, pag. 19); [Você toca o avesso do meu verso/me acende como incenso/Vício insensato,/Fogo-fátuo,/Quando você vem?] (Fogo-fátuo, pag. 22)

[Teu calor semeia/E colhe em mim/Meu pedaço mais terno,/Encantado.//Teu amor é inferno,/Enlouquece e me aquece/No meu próprio amor/Confinado.] (A Outra Mulher, pag. 62).

E recorrente na fantasia sexual, [Me aspira,/Me expele pelos poros,/Pelos pomos, pelos pelos./Brinca com novelos, gata./Numa noite grata./Quando você vem?] (Fôlego, pag. 63); [Para entender tua vulva, tua verve,/Minha boca sorve e serve./Mato tua sede com a minha língua,/Depois calo./Enquanto meu falo/Morre à míngua.] (Oratória, pag. 65); [Me bate/Como bate o peito./Me abate com jeito./Me combate o desejo./Me ordenha./Sela minha fala./Fala minha senha.] (Fel(Ação, pag. 72), et al.

Também é intertextual, com Chico Buarque para trocar em miúdos quando arruma a casa [SE FOR EMBORA/Deixe a porta aberta para sair o resto do amor./QUANDO VOCÊ FOR/(...)] (Arrumando A Casa, pag. 57), ou cria proximidade com Renato Russo, para Eduardo e Mônica, [Ele sem ela/Balão sem gás/Ela com ele/Um som de jazz/Ele sem ela/Comida sem sal/Ela com ele/Canção de Gil/Ele sem ela/Inverno em plutão/Ela com ele/Verão no Brasil/(...)](Feijão E Sonho, pag. 50).

Poetiza, porque cria, os filhos, em “Letícia”, “Arthur”, “Amora”, “Amina” (pags. 51, 52, 53 e 54). E, não esquece dos poetas (mortos), [O poeta cheio/De estar tão vazio/Quis ser um ponto/Entre a ponte e o rio.] (Dom Quixote, pag. 69); [O poeta morre de manhã./O poeta morre e eu sei que acordei/Sem um acorde.] (O poeta morre de manhã, pag. 70)

e, mais, [Dedos, teclas/Num piano/Translucidam o som/Em preto e branco./E na doce alquimia do acalanto/O poeta pousa sobre o muro/Como um poema concreto e puro.] (Ramos, pag. 71). Lembra o poeta, de Flávio de Castro e Ramsés Ramos, em seus traçados p(r)o(f)éticos (in memoriam).

Aprendiz de Planador” é para Machado Júnior uma lição iniciática, na arte e ofício de fazer poético, e, para leitores ávidos por novidades, em razão e sensibilidade, uma leitura recomendável. Geleia gerada, morou?

Macktub!

fotos/imagem: (acervo icsr.org.br/Música Para Todos)

4 comentários:

  1. Obrigado pelo bela tradução, meu querido Maneco.
    Sem letras para expressar o fato, sem palavras para rimar com o ato de ser feliz e grato.

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  2. bom livro. poema certo. homem e humanidade pertos.

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  3. bom livro. poema certo. homem e humanidade pertos.

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  4. bom livro. poema certo. homem e humanidade pertos.

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