terça-feira, 17 de março de 2015

Eita final sujão

Sou de novela também
por maneco nascimento

“(...) Mas o que foi que aconteceu com a Leonor
Tirania, ousadia, ou foi a Janete Clair
Que fez a cabeça desta mulher (...)" (Prendas do Lar - Carlinhos Vergueiro/sucesso de fins da década de 70)

O Brasil detém uma tradição de maior exportador de novelas de tevê. Sucesso no mundo inteiro, com incursões pela China e penetração festejada da inesquecível adaptação de A Escrava Izaura, protagonizada por Lucélia Santos, entre outros grandes sucessos que ganharam o mundo, do ocidente ao oriente, e venceram prêmios de teledramaturgia, o país ainda está no hall de ponta de lança nessa linguagem.

Quem não cresceu, vendo as tramas e dramas janeteclairianos que fizeram escola, ou temas + políticos e engajados que povoaram o universo de Dias Gomes, entre um panteão de grandes criadores e teledramaturgos (Cassiano Gabus Mendes, Benedito Rui Barbosa, Gilberto Braga, João Emanuel Carneiro, Manoel Carlos, Mário Prata, Bráulio Pedroso, Glória Peres, Maria Adelaide Amaral, Aguinaldo Silva, Miguel Falabela e uma inesgotável geração sempre renovável de artistas autores que preencheram a telinha mágica para 30, 50, 70, 120, 170 milhões de habitantes nesse país continental do Iapoque ao Chuí.

“Eu perdi o meu amor para uma novela das 8. Veja só a desilusão, eu me desiludi (...) Agora vive longe eu não sei mais nada, fugiu da nossa casa com a televisão (...)” (Fugiu com a novela - Vanessa da Mata) reflete, em nova leitura, crítico humorada,  as velhas questões de “amores perdidos”, esquecidos, ou desencontros consentidos, quando alguém fica ligado na novela das 2, das 6, das 7, das 9 ou das 10 horas.

Já houve o tempo de se negar as novelas, pois alienantes. O tempo de abraçá-las, pois de entretenimento e lazer, nas pausas para descanso das jornadas impostas pela força motriz do capital e negócios dos donos dos negócios e poder detentores do quinhão de + maioria rica.

A teledramaturgia, às vezes, também consegue ser mata e cura, em microsséries e minisséries, com tempo e argumento que quebram o paradigma de cotidianos mágicos, do mundo de Bob, de sempre felicidade e facilidades que só o feijão com arroz e muita gordura imprimem nos dramas circulares de realismo opera sabão à força da opinião do ibope, medições de tevês ligadas, em lares que não mudam de canal. Aquelas dobram o patrocinador e fogem do lugar comum e mediam equilíbrio, enquanto mantêm o padrão de qualidade premiada.

Assim cominho e orégano temperam a humanidade que se vê refletida na tevê. E já não se quer negar o gosto pela novela, pois parte da cultura nacional. Um colega de cena, ator e diretor, em conversa recente, disse gostar de novelas. Assiste as novelas para ver bons atores e atrizes, boas dramaturgias. Assume que vê novela. Eu o acompanho. Desde que me entendo por gente, que vejo, quando posso, algum capítulo de uma nova trama.

Aliás, peguei gosto pelo teatro, vendo artistas na televisão, desde a era da imagem em preto e branco. Depois, algumas oportunidades de rever os artistas, ao vivo e a cores, em palcos de teatro foi um prêmio.

Ver boas interpretações, bons diálogos e o deslizar convincente, no plano americano, de profissionais migrados da rádionovela, do teatro de tradição e competência e da práxis da cena Opinião e Oficina e das novas oficinas e laboratórios vanguardistas e contemporâneos de criação da personagem não tem preço. Grandes estrelas desfilam talento em meio das indústrias culturais e do anunciante e, coadjuvados por belos rostos e adestrados em série à renovação da plástica da televisão.

Como nem tanto ao céu de divinos e celebridades, nem tanto à terra de desejosos de alcançar a mesma divindade e intuir catapulta ao posto de olímpicos, a todo custo, a teledramaturgia sobrevive para mundo democrático dos bons, dos aceitáveis, dos treinados, dos belos e malditos, dos que nunca pisaram um palco de teatro, dos que nunca leram um livro e dos que aprenderam de cor a lição do enquadramento da tevê.

A televisão sobreviveu à intenet e as novelas, idem. Sexta feira, 13 de março, + uma trama fechou seu ciclo de + de seis meses de dramas, melodramas, comédia e estereótipos, caricatura e criaturas recriadas das geladeiras frankensteinianas e requentados populares que encheram a curiosidade e interesse da audiência brasis. Império era a novela e seu deus criador Aguinaldo Silva et al.

Autor que passou um ano divulgando, antecipadamente, sua narrativa, contratando e demitindo elenco via twitter, fazendo seu marketing pessoal e de sua teledramaturgia e do patrão, acertou + nessa última novela. De bom parceiro em novelas de grande sucesso, e temas rurais e de realismo fantástico aos urbanos, o autor foi fazendo as suas. Algumas com + acertos, outras + enfadonhas, mas sempre cumprindo sua sinopse e tempo de atuação.

Em Império conseguiu recuperar um bom tema e teve um elenco nunca desprezível. Ninguém pediu ao autor para ser suprimido da trama e parecia ser prazer dos profissionais em estarem na cena. Em vias a beijar os cinqüenta anos da Vênus platinada, o autor foi muito feliz até o dia em que teve que construir o “felizes para sempre” e assinar o Fim.

A trama correu o ibope e manteve o Brasil ligado na telinha. Quando chegou a hora de fechar o ciclo e entregar o horário à Babilônia, a próxima nova novela das 9, de Gilberto Braga e parceiros, Aguinaldo parece que gastou muito a pílula e perdeu a madrepérola de douro a capítulo triunfal. Fez das suas, mas parece que em pálida renúncia, ou desgaste de não encontrar melhor efeito.

Fora o fato de bang bang à italiana e fotografia em set de dinamismo policial americano, foram poucas as novidades que deixassem melhores lembranças. O take colhido do alto para canteiro dos mortos, imagem bonita.

Todos os maus são punidos, com a morte pelo fogo quente de arma moral e, a agilidade para a morte de alguns parece não ser eficaz para poupar o anti-herói, purgado com a morte “à treição”, tiro nas costas.

 Um seqüestro, humilhações à mocinha e preferida do pai e homem de preto, as falhas trágicas e as mágicas surreais dos tempos e soluções fáceis descomplicam e finalizam o Império, de Aguinaldo Silva.

Moralismo conservado, público (in)satisfeito, trama fechada com chave de bronze e protagonistas (Lílian Cabral e  Alexandre Nero) impagáveis, em suas construções da personagem, seguidos de perto por atores e atrizes em núcleos de ótima atuação. Até os intérpretes opera soap tiveram ganho de causa.
(A. Nero/Zé Pedro, um fantasma assombra em tempo de (i)mortalidade/reprodução)

Um final morno, sujão, mas padrão de novela das 9. Agora é esperar pra ver o furacão de Gilberto Braga e parceiros. Quem o conhece, o compra sem pestanejar e não parece ser à toa que sua trama assinará os cinqüenta anos da emissora que emprega divinos e divinizados, artistas e artífices da profissão, textos e obras que romperam décadas e criaram um monstro da teledramaturgia nacional, chamado Gilberto Braga que, confessadamente, sempre foi fã de Janete Clair.

Gilberto deu o seu “Pulo do Gato” e construiu o próprio nome e ninguém tasca. Quem tiver dúvida que recorra ao Google, Youtube, a memória de fluxo informacional muito + ágil que os tempos de arquivos mortos e sujeitos, em maior escala de sinistro, a risco de se perder.

(Glória Pires e Adriana Esteves, as marias de fátima e carminhas em eterno retorno/reprodução)

Que venha Babilônia. Já chegou com o assombro de primeiro capítulo quente e envolvente. Mocinhas da tevê assassinas e chantagistas, velhinhas homoafetivas, traição e ambição pelo dinheiro alheio, (in)justiça dos podres e poderosos, mocinhos enganados pelo feitiço da lua da Lucrécia Borgia, filhos estragados pelo amor de proteção cega e as discussões, sempre em pauta revisitada, pioneiras nas tramas gilbertobraguianas, desde que o tempo é tempo de  criar para o autor.
(Fernanda Montenegro & Nathalia Timberg, homoafetividade na terceira idade/reprodução)

O público, de direita, meio, esquerda, volver!, vai assistir sim essa nova trama. Pode até nem confessar, mas que vai “curiar”, de perto, isso vai sim. 

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