terça-feira, 5 de março de 2013

Aqueles Quatro


Aqueles Quatro
por maneco nascimento

Um grupo mineiro de teatro visitou a cidade e deixou sua marca de cena apropriada. De 1º. a 3 de março de 2013 presenteou Teresina com um diverso de simples e estético e complexo e humano e ciência da cena a olhos vistos. “Aqueles Dois”, da Companhia Luna Lunera, de Belo Horizonte (MG), apresentou um belo horizonte de teatro de pesquisa, disciplina, contextos sócio-afetivos e critérios técnicos caracteristicamente eficazes.

Para “Aqueles Dois” prospectado da obra homônima de Caio Fernando Abreu, a Companhia explicou, numa conversa franca e muito produtiva, que chegar àquele resultado com quatro atores em cena, exigiu tempo, conhecimento e novas perspectivas cênicas apreendidas e toda humanidade que houver nessa vida de quem sabe o que quer conquistar com seu teatro.

E a Lunera sabe-o bem. A prova está no palco e no detalhado exercício que trouxe a Teresina, com “Aqueles Dois”, mas que também deixou em passagem por outras paragens em que vem circulando com o espetáculo. Na conversa mantida com a classe, na tarde do dia 3 de março, a partir das 16 horas, no Complexo Cultural do Matadouro – Teatro do Boi, com a mediação do dramaturgo e escritor Aci Campelo, se pode conhecer o processo de montagem da leitura mineira para C. F. Abreu.
 (arte do cartaz de Aquele Dois/acervo da Luna Lunera)

Aqueles quatro atores falaram de suas experiências pessoais de artistas, do histórico da Companhia, da escolha do texto e do conspirado processo de finalização da peça, a partir de improvisação, seleção de material improvisado, roteiros de direção, haja vista cada um dos envolvidos no processo apresentarem um viés próprio de desconstrução da dramaturgia e construção da cena posta.

Estão lá, na cena, dados da obra de Caio, das cartas e intertextuais elementos presentes em sua literatura, como as transversais identidades dele trazidas para a montagem, sejam de aproximações de linguagens, sejam das memórias afetivas de cada um daqueles quatro em ato concentrado. E essas peças, do jogo dramático, que foram montando o enredo de cena visto, tinham também sugestões do público interativo que participou dos ensaios abertos, ou apresentações em dinâmicas de afinação.

Da luz do poste da rua, que vaza ao estúdio de ensaios, base do laboratório de criação da Lunera, ao construtivismo estético que define o universo doméstico, ou do escritório em que ganham vida as personagens quadruplicadas, toda a obra dramática exposta traz uma virtuose do Ator criador, compondo essências, olhares particulares e senso plástico-estético do artista dramático ao objeto dissecado, a prosa de Caio F., numa linguagem dinâmica que não perde nunca a concretude do real ficcionado e nem foge, também, da práxis do fingimento acurado.

Aqueles quatro elementares da criação apresentada, Cláudio Dias (criação, direção e dramaturgia), Guilherme Théo (ator na cena), Marcelo Souza e Silva (criação, direção e dramaturgia) e Odilon Esteves (criação, direção e dramaturgia) deixaram na conversa sobre o processo de montagem, senão uma ótima impressão a quem quis ouvir sua história, também toda uma sinceridade de compartilhar a experiência de quatro atores de uma Companhia que soma também três mulheres, fora do processo de montagem, e um repertório de experiências individuais, que contidas no coletivo, contêm definida técnica declarada de sua ação de teatro ruminado a novas interpretações.
(Aqueles Dois/foto: acervo da Luna Lunera)

Um quinto elemento, Zé Walter Albinati(criação, direção, dramaturgia, relator do processo, voz e arranjo vocal), que não veio a Teresina, fecha com Rômulo Braga (criação, direção e dramaturgia) o círculo das estratégias de preparação ao fingir bem e convencer quando a hora é do teatro. Aqueles quatro, na cena, sejam os atores criadores, sejam as personagens quatro vezes apresentadas para “Aqueles Dois”, uma pérola aos outros que acorreram à curta temporada no Teatro do Boi.

Final de semana (1º. 2 e 3 de março) instrutivo, pedagógico porque aprendeu-se a aprender vendo o colega encenando e viu-se em dinamismo de interação com objetos “inanimados” uma vida de signos, códigos, língua e linguagem que reinventam conflitos e catapultam novo olhar à cena brasileira, dessa feita mineira.

 Do público, houve para todos os perfis. Os que chegaram bem antes do abrir das portas da Casa; os que chegaram no limiar do atraso; os que afobaram no silêncio da cena e interferiram nos recortes de delicada luz e os últimos que, sem chance de serem primeiros na fábula bíblica, perderam a chance de ver um espetáculo em rito de passagem à excelência de melhor ato.

 (Aqueles Dois/foto: acervo da Luna Lunera)

Aos atrasados da vez, perderam um quente e confortável teatro d’Aqueles quatro para “Aqueles Dois”, da Luna Lunera, que riscou luzes em céu das cenas, pela primeira vez em palco teresinense. Evoé, teatro brasileiro.

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