Salve, Provi!
por maneco nascimento
Em dias de Teresina 40 graus, a cidade recebeu a notícia de que a Providência
divina chamou aos seus, de hora privilegiada, um amigo,
artista e respeitável fotógrafo, técnico/professor de fotografia de laboratório
do Curso de Comunicação Social – Jornalismo (UFPI), cenotécnico, cenógrafo,
iluminador e diretor/encenador do teatro local.
Meu primeiro contato com José da Providência ocorreu quase por acidente.
Ia passando em frente aoTheatro 4 de Setembro, lá pelos idos de fins da
década de 1970, quando descobri que estava havendo uma conversa sobre teatro. Porta
aberta, comum na cultura de igrejas, entrei. Deparei-me com um grupo de
artistas na platéia e, no palco, estavam o diretor de teatro José da
Providência e o elenco de “A Guerra dos Cupins”.
O espetáculo “A Guerra dos Cupins”, com
texto de José Afonso de Araújo Lima, outro grande amigo, reunia atores como
Lari Sales, Zé Afonso, Preta, Nádya, Teresinha e Fábio Costa. Uma comédia, dirigida por Provi, que percorreu vários palcos
brasileiros e já nascera premiado, por reunir um elenco enxuto, uma dramaturgia
textual críticorreflexiva e por representar política de cena muito eficiente e
direção inteligente e moderna.
Na conversa sobre teatro, que acompanhei àquela ocasião, pude ouvir José
da Providência, com sua calma e conhecimento exercitado, discorrer sobre montagens,
teatro e técnica, interpretação, cultura da cena e sobre a montagem,
propriamente. Toda a conversa franca, interrelacionada com o teatro teórico e
prático. Ali me apeguei, incondicionalmente, aquela persona de teatro.
Provi era mesmo uma personagem do teatro nacional. Sabia das coisas porque
garimpou conhecimento. Não era esnobe, exigente. Mantinha argumentos baseados
no conhecimento. Depois, em sendo um homem introspecto, de poucas palavras,
mesmo quando provocado, era muito atencioso.Sucinto,
respeitador e acima de tudo humano e bem humorado, do seu jeito. Entendia a
piada quem tivesse repertório.
Com a proximidade natural do ator ao Theatro 4 de
Setembro, qualquer artista tinha que conviver com o Provi. Seu humor diferenciado
deveria ser tratado com cuidado e compreensão. No fundo, mesmo com sua forma
ríspida, de por vezes, atender a um pedido ou solicitação, sempre dizia não que
era dizer sim, a seu tempo. Bom ouvinte, de ironia refinada,
sempre ensinava inquirindo, a la socratiana. Também contava piada, com calma e
tranqüila economia de comunicar, facilitando o entendimento.
Um dos grandes diretores do Theatro 4 de Setembro, era respeitado e
conhecido por grande parte do mundo teatral brasileiro. Excelente
fotógrafo, construiu um acervo da memória teatral brasileira e local invejável.
Foi coordenador técnico daquela Casa por muitos anos até sofrer armadilha de
petistas deslumbrados e vingativos.
No governo de Sônia Terra e Chagas Vale, na pasta da FUNDAC, foi afastado, de forma
incomum, da direção técnica do 4 de Setembro, onde também exerceu,
anteriormente, a direção geral da Casa. Um despacho, daquela presidente da FUNDAC
e sua assessoria, dava conta de que ele estava fora do “quadro” do
Theatro do PT. O documento ficou dias, sobre a mesa do então diretor geral da Casa,Assaí
Campelo.
Corre a lenda que o técnico iluminador não teve coragem de entregar o
documento ao Provi. Foram amigos de mesma geração do movimento teatral. Aquele, técnico
iluminador respeitável e este, um excelente diretor/encenador. Componente
do grupo da legenda alçada aos cargos públicos, o iluminador ficou preso entre
o constrangimento pessoal de ingrata notícia a um amigo de profissão e a
omissão partícipe da derrubada do diretor “anti-social”, segundo seus
detratores.
Provi soube de sua demissão da pior forma possível, quando todo o mundo já
sabia, menos o maior interessado. Uma puxada de primeira. A alegação oficiosa,
que o artista acumulava cargos públicos. Já que
funcionário da UFPI, havia que abrir mão do trabalho (não era emprego) na
esfera estadual. Ser franco na hora de escolher equipe de trabalho é uma nota,
agora queimar a confiança de um artista feito fogo em monturo, seria uma
sinfonia de cilada e traição a artista respeitável.
Não fácil aos amigos, muito menos ao Provi. Teve problemas graves de
saúde, que foram sanados com o apoio emergente dos amigos de sempre e um dedo
solidário da Providência divina. Atualmente mantinha, com muita regularidade, seu compromisso com
a UFPI. Fui aluno seu, no laboratório de
fotografia do curso de Jornalismo. Professor querido por todos que passaram
pelos corredores da Comunicação Social. Fará falta.
Foi encontrado morto em seu apartamento, na Rua Barroso, zona centro da
cidade. Gostava de silêncio, do silêncio das línguas cansadas como vaticinou o
poeta.
Era um homem de poucas visitas, de muitos amigos e admiradores e de uma vida
simples, sem arrogância ou ambição premeditada por poder. Era
artista, na essência da acepção. E entendia de teatro e fotografia, arte e
estética da arte. Um homem de seu tempo de ser como sempre foi.
A medicina forense detectou, segundo informações colhidas de Airton
Martins, que o nosso querido Provi teria morrido, aproximadamente,
às 6 da manhã, do dia 29 de setembro (sábado) de 2012. Tinha acumulado um
diabetes e hipertensão arterial. Sofreu um infarto fulminante. Passou
à eternidade, em casa, sozinho como sempre escolheu viver, no limiar do novo
dia. Usava trajes íntimos e foi encontrado no chão, após + de três dias do
ocorrido.
Um enterro rápido, devido às circunstâncias, no cemitério São José, em jazigo
da família. Deixou-nos,José da Providência Pinto de Carvalho, aos 69
anos,
sem alarde, em silenciosa manobra do destino a sua vida recolhida, numa manhã
principiada no ardor da cidade verde 40 graus.
“Façam silêncio, Provi foi alçado à Providência. Uma flor rara foi
plantada nos campos do Senhor. Façam uma prece, porque a memória nos enche de
alegria, embora sua passagem nos estarreça. Os tempos e as horas sempre foram
assim...”
Provi, Provi! Que o palco desse novo cenário que agora principia seja feito de
tranqüila alegria, paz e arte que a seu modo você sabe destrinchar e, em
exercício urgente, reúna Santana e Silva, Gomes Campos, Ana
Maria Rêgo, Raimundo Dias, Elzano, Gardiê Silveira e faça desse céu o palco de
um teatro vivo.
Com amor de sempre, nós que privamos de tua companhia.
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