Agreste fabuloso
por maneco nascimento
A Cia. de Teatro FACES, do Mato Grosso, através do SESC Amazônia das Artes, apresentou às 9 da manhã, do dia 10 de agosto de 2012, no palco do Theatro 4 de Setembro, o infantil “ O Menino e o Céu”. Um arremate de lúdico e fantasia que se apropria da cultura popular nordestina e ainda tece uma discreta homenagem ao “Lua” que, para este ano 12 do século 21, completa cem anos de nascimento.
O release da Cia., sobre a montagem, abre a discussão do sonho como fio condutor da vida. A criança diante da possibilidade de voar e persuadir as nuvens que chovam e aplaquem a secura do sertão e acalentem a vontade da alma. O enredo coloca a criança diante da perda, da impossibilidade e da morte, situações que “machucam a ludicidade do imaginário infantil” (falas do grupo).
Texto e Direção, de Wanderson Lana, vão-se complementando e abrem a perspectiva de fantasia, veredas do mágico e do encanto para infantes, sem discurso vertical.
Toda a dramaturgia literária vem-se afunilando para elementar a dramaturgia da cena que, simples e emblemática, é representativa da direção de arte. Wanderson também assina os Figurinos que vestem bem as personagens e recriam os bichos, sem caracterizá-los de forma realista crua.
O jumento com sua cangalha, feita de retalhos às vezes das cores nacionais do nordeste de qualquer memória afetiva do animal, amigo do homem, causa efeito singular aos olhos das crianças da recepção.
Um sapo que, na inapetência de poder saltar, em face das agruras da seca, arrasta-se pelo chão, sem nunca perder a alma do batráquio, outra sacada crítico construtiva. Há na solidariedade solidificada, um empenho tácito, o animal (jumento) que carrega o outro (sapo paralítico) ao lombo e ensina o companheirismo, numa pedagogia livre de obrigações.
A dramaturgia de cena é rica em liberdades finalizadas que apontam para bichos que falam por si só, em linguagem corporal equilibrada, sem caricaturas nem ilustrativos de representação óbvia. São o urubu e um Asa Branca que voam sem sair do chão e, ainda assim, o lúdico aparece sem nos deixar dúvidas de que são aves e contam sua história interativa do drama do “Menino do Céu”.
O camaleão, elétrico-dinâmico, que vai mimetizando-se sem parecer que está mudando de cor, salvo a ótima idéia do figurino que vai sendo descartado, peça por peça, sem desgrudar do corpo do ator e apresentar a troca de pele que são casacos variados. Ótima saída para fuga teatral sem perder o fio de Ariadne.
A pesquisa de corpo para a construção das personagens que se vão revelando e recriando verdades para bichos presentes, um luxo de reinvenção da fórmula da pólvora. Abriga novidade no simples e criativo ato de convencer através do ator e sua marca elaborada na práxis do fingimento.
Os corpos falam em coreografias que delineiam movimentos e alma dos bichos, o camaleão, o jumento, o sapo, o Asa Branca e o urubu. Há todo um desenho finalizado para gestos, falas e oralidades dos silêncios e ruídos das personagens “complexos” no drama apresentado.
A cenografia (Yuri Lima Cabral), um achado representativo do sertão de dentro pra fora e de fora pra dentro, expressionista da aridez da fábula contada. O trapézio feito à base de madeira natural que recebe as variantes de dias e dias do sertão seco, rústico e presente. Cavaletes em que são estendidos os emblemas, cortinas da mãe lavadeira, contadora dos percursos do menino na costura das horas, dias e movimentos do sertão que parece não se mexer.
O vestuário das personagens, singelos achados. A barra do vestido materno, que se fecha em bordados de pregadores, um “link” ao fato de ser ela quem estende os “stands”, móbiles (cortinas) da representação do cenário que conta as agruras e desenredos factuais d’O Menino do Céu”.
A Direção de Sonoplastia, de André Gadotti, é luxuosa. A música ao vivo, com os sons de um acordeon, + uma vez representa-se à verve da memória afetiva do ícone Luiz Gonzaga, assim como reproduções de composições do Rei do Baião brasileiro. As vozes naturais repercutem canções populares, laranja da terra, também preenchem no simples a história e memória musical direcionada ao enredo.
A Sonoplastia, de Ana Paula Dorst, tem uma precisão de definir vozes e gestos clownescos dos bichos fabulosos, pela “viagem” de efeitos incidentais. A Iluminação, Darci Junior, favorece os belos recortes que desenham o calor e a força inclemente da natureza da seca representada. Delicadezas do falso fácil e do simples artístico. A Maquiagem, Wanderson Lana, pele e capa dos bichos que delineiam as máscaras dramáticas com toda eficiência.
Do elenco, um time fechado para gol de placar. Yuri Lima Cabral, Kiko Sontak, Victor Martins, Luiz Antônio Freitas, Wanderson Lana, Edilene de Jesus e Dionathan Felipe estão concentrados em contar uma história para encanto de crianças e adultos. Desempenham teatro e ciência confirmados em presença bem articulada.
As memórias afetivas são muito presentes à cultura popular e linha do tempo das vidas secas. As passagens de plano, vida-morte, representadas em giraus da morte, tipicamente identitárias. O enterro em cortejo, na rede, também muito representativo nas vidas agrestinas. A árvore seca fulminada pelo sol, outro elemento indispensável como emblema.
Há uma infinitude de boa história contada e uma finitude de cena que não se espera que ocorra. A licença poética da chuva colorida e o circo com sua guirlanda de bandeiras coloridas, como um céu do sertão da fantasia por onde o menino consegue voar depois de sua “morte”, uma alegria de representação da alma humana em festa na empanada do maior teatro do mundo.
Bom desenho dramatúrgico, elenco liberado 101% para a fantasia premeditada e um belo tema desenvolvido para risos e sofrimentos na pecha do lúdico. O Projeto SESC Amazônia das Artes forma platéia e diz a que veio. O público infantil agradece a gentileza teatral.
por maneco nascimento
A Cia. de Teatro FACES, do Mato Grosso, através do SESC Amazônia das Artes, apresentou às 9 da manhã, do dia 10 de agosto de 2012, no palco do Theatro 4 de Setembro, o infantil “ O Menino e o Céu”. Um arremate de lúdico e fantasia que se apropria da cultura popular nordestina e ainda tece uma discreta homenagem ao “Lua” que, para este ano 12 do século 21, completa cem anos de nascimento.
O release da Cia., sobre a montagem, abre a discussão do sonho como fio condutor da vida. A criança diante da possibilidade de voar e persuadir as nuvens que chovam e aplaquem a secura do sertão e acalentem a vontade da alma. O enredo coloca a criança diante da perda, da impossibilidade e da morte, situações que “machucam a ludicidade do imaginário infantil” (falas do grupo).
Texto e Direção, de Wanderson Lana, vão-se complementando e abrem a perspectiva de fantasia, veredas do mágico e do encanto para infantes, sem discurso vertical.
Toda a dramaturgia literária vem-se afunilando para elementar a dramaturgia da cena que, simples e emblemática, é representativa da direção de arte. Wanderson também assina os Figurinos que vestem bem as personagens e recriam os bichos, sem caracterizá-los de forma realista crua.
O jumento com sua cangalha, feita de retalhos às vezes das cores nacionais do nordeste de qualquer memória afetiva do animal, amigo do homem, causa efeito singular aos olhos das crianças da recepção.
Um sapo que, na inapetência de poder saltar, em face das agruras da seca, arrasta-se pelo chão, sem nunca perder a alma do batráquio, outra sacada crítico construtiva. Há na solidariedade solidificada, um empenho tácito, o animal (jumento) que carrega o outro (sapo paralítico) ao lombo e ensina o companheirismo, numa pedagogia livre de obrigações.
A dramaturgia de cena é rica em liberdades finalizadas que apontam para bichos que falam por si só, em linguagem corporal equilibrada, sem caricaturas nem ilustrativos de representação óbvia. São o urubu e um Asa Branca que voam sem sair do chão e, ainda assim, o lúdico aparece sem nos deixar dúvidas de que são aves e contam sua história interativa do drama do “Menino do Céu”.
O camaleão, elétrico-dinâmico, que vai mimetizando-se sem parecer que está mudando de cor, salvo a ótima idéia do figurino que vai sendo descartado, peça por peça, sem desgrudar do corpo do ator e apresentar a troca de pele que são casacos variados. Ótima saída para fuga teatral sem perder o fio de Ariadne.
A pesquisa de corpo para a construção das personagens que se vão revelando e recriando verdades para bichos presentes, um luxo de reinvenção da fórmula da pólvora. Abriga novidade no simples e criativo ato de convencer através do ator e sua marca elaborada na práxis do fingimento.
Os corpos falam em coreografias que delineiam movimentos e alma dos bichos, o camaleão, o jumento, o sapo, o Asa Branca e o urubu. Há todo um desenho finalizado para gestos, falas e oralidades dos silêncios e ruídos das personagens “complexos” no drama apresentado.
A cenografia (Yuri Lima Cabral), um achado representativo do sertão de dentro pra fora e de fora pra dentro, expressionista da aridez da fábula contada. O trapézio feito à base de madeira natural que recebe as variantes de dias e dias do sertão seco, rústico e presente. Cavaletes em que são estendidos os emblemas, cortinas da mãe lavadeira, contadora dos percursos do menino na costura das horas, dias e movimentos do sertão que parece não se mexer.
O vestuário das personagens, singelos achados. A barra do vestido materno, que se fecha em bordados de pregadores, um “link” ao fato de ser ela quem estende os “stands”, móbiles (cortinas) da representação do cenário que conta as agruras e desenredos factuais d’O Menino do Céu”.
A Direção de Sonoplastia, de André Gadotti, é luxuosa. A música ao vivo, com os sons de um acordeon, + uma vez representa-se à verve da memória afetiva do ícone Luiz Gonzaga, assim como reproduções de composições do Rei do Baião brasileiro. As vozes naturais repercutem canções populares, laranja da terra, também preenchem no simples a história e memória musical direcionada ao enredo.
A Sonoplastia, de Ana Paula Dorst, tem uma precisão de definir vozes e gestos clownescos dos bichos fabulosos, pela “viagem” de efeitos incidentais. A Iluminação, Darci Junior, favorece os belos recortes que desenham o calor e a força inclemente da natureza da seca representada. Delicadezas do falso fácil e do simples artístico. A Maquiagem, Wanderson Lana, pele e capa dos bichos que delineiam as máscaras dramáticas com toda eficiência.
Do elenco, um time fechado para gol de placar. Yuri Lima Cabral, Kiko Sontak, Victor Martins, Luiz Antônio Freitas, Wanderson Lana, Edilene de Jesus e Dionathan Felipe estão concentrados em contar uma história para encanto de crianças e adultos. Desempenham teatro e ciência confirmados em presença bem articulada.
As memórias afetivas são muito presentes à cultura popular e linha do tempo das vidas secas. As passagens de plano, vida-morte, representadas em giraus da morte, tipicamente identitárias. O enterro em cortejo, na rede, também muito representativo nas vidas agrestinas. A árvore seca fulminada pelo sol, outro elemento indispensável como emblema.
Há uma infinitude de boa história contada e uma finitude de cena que não se espera que ocorra. A licença poética da chuva colorida e o circo com sua guirlanda de bandeiras coloridas, como um céu do sertão da fantasia por onde o menino consegue voar depois de sua “morte”, uma alegria de representação da alma humana em festa na empanada do maior teatro do mundo.
Bom desenho dramatúrgico, elenco liberado 101% para a fantasia premeditada e um belo tema desenvolvido para risos e sofrimentos na pecha do lúdico. O Projeto SESC Amazônia das Artes forma platéia e diz a que veio. O público infantil agradece a gentileza teatral.
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