por maneco nascimento
“(...) E uma mulher, que se assume como MULHER, que também sente desejos, fantasias, vontades, sem estar condenada a um compromisso, ainda é motivo para exclusão, deboche e preconceito (...) escuto muito praguejamento e desdém vindo das próprias mulheres (...) há uma pontinha de inveja, por conta de uma ousadia e coragem que elas não têm. E quanto aos homens (...) a maioria deles não estão habituados a se deparar com MULHERES DE VERDADE (...) essas que têm muito a oferecer (...) muito além do que as determinaram numa cultura machista e limitante (...)” (Trajano, Vanessa Teodoro. Mulheres incomuns. Teresina: Halley, 2012. 95 p.[Um telefonema apenas, pg.72])
Uma jovem escritora (ou escritora jovem?), grifo de Feliciano Bezerra, é dela obra que reúne Contos femininos em seu primeiro vôo de autora. Vanessa Trajano junta, em edição, vinte contos inspirados para “Mulheres incomuns”.
Há um diverso de impressões, de primeiras escritas, que vão se assemelhando das tintas sobre o branco papel em livre iniciativa de criadora das falas sociais. Falas que compõem a natureza humana e, diria, o “eu literário” presente nos corajosos e impetuosos autores e produtores de textos para consumo de mercado.
São vinte histórias, quase todas de viés de eu feminino. Narradas, por vezes, em terceira pessoa, noutras em primeira. As personagens vão vomitando suas horas, desejos, fantasias, discursos panfletários, e incursões de feminismo libertador e feminino para alhures e dispersos, como bem define em poema de apresentação da obra:
“Mulher em partes – Eu não sou inteira/Sou feita de partes/Não todas juntas/Nem misturadas,/ Apenas somadas/Uma a uma./Há partes minhas/Por aí soltas/E quando eu as encontrar/Perderei outras/Partes, quantas partes?/Fazei de mim tudo,/Que cada parte queira/Qualquer coisa/Menos inteira.”
Bom poema justifica as peças do livro que estão em diverso de situações, umas melhores construídas, outras em dispersão de menor acerto. Há contos que são apresentados em um excesso de palavras “difíceis” para leitura que mereceria ser a propósito rápido, prático, eficiente e de comunicação direta, como pareça, ou talvez mereça ser, em uma antologia de contos.
Por vezes, a escrita parece ser sobrecarregada de linguagem “arcaica”, romantismo de principiante e certos superlativos, quase um preciosismo lingüístico que cria ruído à comunicação direta das histórias empreitadas.
Exemplo + direto desse “abuso” de palavras e construções de períodos desgastados pelo excesso de virtuose de conhecimento armazenado, talvez de leituras mal digeridas, seria:
“(...) muitíssimas amigas – (...) Era uma gigantesca união que ornamentava e desferia àquele quarteto uma elevada soberania (...) cabelos loiros de doer a vista, bem radiantes e a pele lívida e casta que cheirava a ingenuidade. Um rosto quadrangular que assentia ao molde desejado pelo padrão de beleza, assim resplandecido. Oh, era tão cândida! As borboletinhas azuis reluzentes que seguravam a franja teimosa (...) faziam inocentar ainda mais a feição copiosa (...)” (Clube da Luluzinha, pg. 38)
A descrição das amigas do Clube da Luluzinha estende + rigor descritivo, de conhecismo“(...) Na cor, no cabelo, o que a distinguia era que havia uma pitada de obscuridade (...) que ser parda lhe dava certo grau de inferioridade (...) carregavam no peito a altivez e a periculosidade de mulheres sedutoras: com viço latente intrínseco de flores recém-desabrochadas (...) Tagarelavam sobre seus complexos e numerosos problemas cumulativos (...)” (Idem, pg.39)
( imagem colhida de umbrellachaos.com )
Frases de efeito impressionador, em que a autora se empolga, “(...) ele maquinalmente e com reverendíssimo carinho cedeu ao pedido (...) A despedida foi lindíssima e comovente (...) dissimulava com minuciosidade e perfeccionismo a ternura que deveras sentiam (...) não abriam alas para suas passagens mimosas e colossais, elas ficavam indiguinadas e inexoravelmente acusavam com dizeres turvos e enigmáticos (...) em suas Vossas Altezas galgadas (...)” (Idem, pgs. 39, 40)
Em poucas páginas, o livro fica recheado de exageros de linguagem e produzido texto, “(...) tinham demasiada relutância com a própria imagem (...) o tamanho de seus limites compráveis (...) a epifania milagrosa não durou muito tempo (...) descerem do carro, bem majestosas como de costume (...) Houveram enlaces etiquetados no encontro (...) eram embevecidos seus semblantes nas fotografias lustrosas (...) todas sorridentes e reincidentes (...) comentários maldosos ou donaire a respeito (...)” (Idem, pgs. 40, 41).
Por fim, o conto Clube da Luluzinha encerra-se em certo e severo estilismo próprio, “(...) um vício compulsório que as vezes meneavam ao ato registratório do que não acontecia (...) vez por outra cingiam a face novamente, exaustas por tantos sorrisos sublimes impostos (...) com a insistência duma conduta condicionada (...) com benção das riquezas (...) uma força recôndita que as motejavam a tal comportamento...” (Idem, pg. 41).
Afora esse “culteranismo”, certo barroquismo no jogo das palavras, nesse conto especificamente, há em outros momentos a reunião de escritos, peças que estão + próximos de uma enxuta construção textual, com boa coesão e coerência de aplicação para textos reunidos. Os em que as falas do feminino estão + nos enredos de fantasias e desejos realizados, violência e auto-flagelo?, a autora desempenha bem.
Os contos eróticos, “Aquele homem” (19/29); “Virgínia” (43/53); “A pura leviana” (60/63); “Para Narciso”(65/69); “Enlace Matrimonial” (74/80); “Verônica e seus pilares”(84/89)enveredam por discurso da loba de Ray ban ou Lucrécia contemporânea, no super pulo da gata em teto de zinco ardente. Acerta melhor. Noutros, quase beiram às falas sociais de disfarçado preconceito, ou devoção do risco do aceito/nego, “Se eu fosse uma garota de programa” (81/83) e “Deusinha” (92/95).
Talvez, para completar um número à coletânea, a autora tenha preenchido com alguns menos expressivos, ou de encolhida decisão em deixar de fora, “Renascer” (73); “A armadilha do não identificador de chamadas: traição confessada” (90/91); “A rival” (11/12); “Roupas” (7/10), et all.
Grosso modo, há um definido discurso do feminino variável entre a liberdade e o interdito, para (im) puras e santas, fatais e melancólicas, decididas entre o prazer e a culpa. Mulheres do diverso do eu literário, deslizando em tessitura impregnada de belicismo (in) conseqüente e um cultismo de palavras e expressões que engordam as linhas e defasam uma melhor criação.
“Mulheres incomuns”, de Vanessa Trajano, salvo alguns deslizes de revisão e talvez de vaidade primária, a quase beirar diário pós-adolescente, em aliterado de informações sobrepostas ao contexto da idéia, é uma reunião de textos que deixam sinal de aprendiz de feiticeira.
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