Cotidianos e (des)esperança
por maneco nascimento
11 poemas, uma cópia de fotografia aérea do
mapeamento da cidade, uma capa em papel “craft” e um miolo de poemas em “ofset” AP (apergameado),
essa é apresentação do livr(et)o de Rodrigo M Leite, “a cidade frita”(Leite,
Rodrigo M. Teresina: Edições “Viver Teresina”, 2012.).
Todas as licenças garantidas à
poesia e um risco aplicado de versos contundentes, reais e identitários à verve
da cidade verde. “a cidade frita entre os rios/asfalto brita calafrios/a idade
grita entre as pernas/sal limão sangue de menstruação”, é o segundo poema, o
tema- capa.
O primeiro, a capa em “craft”(cor
madeira) e no centro dela um círculo fechado em preto, de onde brota o título da publicação "a cidade frita" (letras minúsculas na cor “craft”.) O aparente simples da
apresentação, em capa, um jogo de símbolos entre o comum e o utilitário
estético. Depois do poema que intitula a obra, um mapa aéreo, em xerox,
da cidade difusa entre dois rios e delineada em seus traçados da planejada.
Em [Fotografia], na ordem dos
versos impressos, a cidade delineada a matiz desbotado “O azul não é leve nem
produz carinho,/O contorno torto e opaco./O vermelho está morto./O amarelo
esbranquiçado, adoecido.”. Ouvidos e olhos poetas registram novidades e
desencontro, em si mesmos e nublados.
As mortes sociais e físicas, bifurcadas,
se encontram em “Chiquinho desceu às margens do rio:/Catou umas
garrafas/Colocou-as num saco,/Numa caixa de fogão vazia,/Deu uma passadinha no
Boca da Noite/E perdeu-se dentro da noite fria./(a imprensa no dia seguinte não
noticiou o acontecido)" [Chiquinho Garra] e ainda “O morto esboçado no chão com
sua moto/Não é lembrado no Mercado Central/Onde cresceu e há anos não aparece
(...)” [Previsão do Tempo]
À solidão do coletivo penado se
inscreve em letras tais, “No meio do tempo e da história/Das almas que estão penadas
(...)/Estamos todos, juntos e/sozinhos/Num poema de dezembro.” [Inscrição] e em
“Num puta boteco pros rumos do Verdão,/O tempo está parado num relógio sem
pilhas (...)/E o coração dos homens lá dentro,/Vai sem muita pressa.” [Centro
Norte]
Pelas memórias familiares e de
DNA, a letra diz “Por um instante/Registro na retina da pobre velha/Sentada na
calçada com suas irmãs/O meu rosto: único/Assim como o teu o de Milton o de
Adriana/É só mais um que colore o olhar vacilante da velha/No dia-a-dia dos
ossos” [A Fadiga dos Dias].
O cotidiano das periferias
humanas está em [Despertar] “Urubus nos postes do Parque Piauí/Esperam miúdos
de frango jogados na mesma rua/Onde Assis caminha com o Brasil no peito/Na
cabeça na caneta rumo ao mercado./ Uma carroça de massará/Range ferro com
ferro/A ferrugem a madeira o capim/O chicote nas costas do animal/O bater de asas
da liberdade/rumo à carniça/O sino do motoqueiro do gás/O silêncio de Assis
(...)/Todos os ruídos são despertos.”
A indústria cultural emblematiza-se
nas inscrições de marketing de consumo “E nas paredes, mulheres desbotadas com
garrafas de/ Catuaba Guaracy (...)" [Centro Norte] ou “A garota do outdoor
continua intacta,/Frescura ninfal, na Raul Lopes./Ilesa, assiste seus
comerciais de TV/Pintando as unhas, depilando o buço./Em pupilas dilatadas,
rabos de olhos tráfegos/Segue para a eternidade das coisas vãs (...)” [A Garota
do Outdoor].
A desesperança no olhar da vida “Tudo
é desgosto desvio/Tristeza arrepio/Numa pracinha da desilusão” [Pracinha da
Desilusão] e “E a vida, ferrugem do balcão, está no fim/Aos poucos sendo
vencida./Os velhos não se olham mais nos olhos” [Centro Norte] ou “Amanhã o dia
será chuvoso/Poucos irão ao seu enterro” [A Fadiga dos Dias].
O poeta recolhedor de memórias e emoções,
da própria natureza flagrada, prevê o tempo “O recém nascido Evangelina Rosa
grita primavera rouca,/Coro que anoitece os olhos do pai (...)” [Previsão do Tempo].
E, criticamente, o poeta observa,
como cronista do cotidiano, o hibridismo cultural à hegemonia de comportamento
pastel “Os ônibus tiram fino das garotas do CPI, todas iguais (...)” [Previsão
do Tempo] ou “Ilesa, assiste seus comerciais de TV/Pintando as unhas, depilando
o buço (...) Segue para a eternidade das coisa vãs (...)” [A Garota do Outdoor].
Teresina, essa verde cidade
menina com sua temperatura comum aos nossos dias, em controverso de horas amenas
ao calor incompensado, “Frescura ninfal, na Raul Lopes (...)/Na quentura do
dia.” [A Garota do Outdoor] ou “Pétalas de aço enferrujado rasgam o asfalto/Frei
Serafim em meio do dia da/Quentura dos infernos (...)” [Previsão do Tempo].
Poema, poeta ao calor da idade dessa
cidade mulher que abre-se em licença poética “A cidade frita entre os rios/asfalto
brita calafrios/a idade grita entre as pernas/sal limão sangue de menstruação”
e "O calor, Tito, não é um mito.”.
Todo o poema “desfolha uma
bandeira”, Rodrigo M Leite, um “homemleite” em registro da cidade só.
(re)publiquei o texto:
ResponderExcluirhttp://acidadefrita.blogspot.com.br/
abraço,
rmleite.
prazer em poder conhecer sua poesia, vc escreve com um cinzel de quem conhece o mármore de Moisés
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