Balaio cultural
por maneco nascimento
Um furacão, de sons, luzes e cores, alegria e cena coroada, passou por Teresina entre os dias 16 e 17 de
junho e deixou desalinhado o terreiro do teatro local. Para
quem pode experienciar a práxis cênica do coletivo de Clowns de
Shakespeare, Grupo natural de Natal, Rio Grande do Norte, não
se arrependeu do que presenciou.
No balaio do Grupo, uma montagem divertida, irreverente, classuda e, especialmente,
muito requintada em tratamento ao teatro popular de um clássico de William
Shakespeare, Ricardo III. No quintal do Teatro Municipal João Paulo II, dia 17 de junho de 2012,
a partir das 19 horas, um doce deleite à assistência, através da
linguagem clownesca burilada. Foi vista pelo viés particular de leitura do Grupo
Clowns de Shakespeare, Fernando Yamamoto e Gabriel Villela a conta
perolada “Sua Incelença, Ricardo III”.
(Sua Incelença, Ricardo III/foto: Pablo Pinheiro)
E, de saída, a agremiação deixou aos leitores da cidade e artistas da cena a Revista
Balaio (Ano I, No. 01/set. 2009). Uma publicação do Grupo de Teatro Clowns de
Shakespeare. No sumário, destaca-se em capítulos, o processo de
(re)invenção de “Sua Incelença, Ricardo III”. Abre a revista o artigo“Memórias
de coletivos teatrais: breves apontamentos de percursos e andanças” (pags.
8 a 13),
deAlexandre Mate, educador do Instituto de Artes
da UNESP, da Escola Livre de Santo André e pesquisador de teatro.
Todo o restante da edição está dedicado ao Dossiê
Ricardo III, para tornar público o Projeto Caravana de
Investigação Teatral: Ricardo III, desenvolvido no segundo semestre de 2008, em cinco etapas,
para cinco cidades potiguares(Angicos, Assu, Santa Cruz, Currais Novos e Natal). Projeto facilitado pelo BNB
– Programa BNB Cultura 2008, engajou oficinas a partir da obra Ricardo
III,interagindo
experiências com artistas e grupos locais das cidades escolhidas.
Fernando Yamamoto, da trupe Clowns de Shakespeare, apresenta
o Dossiê Ricardo III e assim se declara
envolvido “Somos mais uma vítima da cruel sedução de Ricardo, o Duque de Gloster.
Junto aos seus comparsas Márcio, Jan e Gabriel, Ricardo nos envolveu de uma
forma que não temos mais como escapar (...) Durante essa mesma residência em
São Paulo, outro grande mestre surgiu no nosso caminho, o encenador Gabriel
Villela (...)” (Yamamoto, Fernando. Dossiê Ricardo III – Apresentação/Revista Balaio,
pags. 14 a 17)
O Processo de investigação de construção da encenação é dividido em atos
e, para o Primeiro Ato, Angicos, o relato da experiência na primeira cidade é realizado pela
integrante do Grupo, Renata kaiser. “A
primeira cidade a receber a Caravana de Investigação Cênica é mundialmente
conhecida pelas experiências pioneiras do educador Paulo Freire (...) Ao longo
de uma semana, o grupo se deparou com o desafio de apresentar um texto clássico
a um público com pouco hábito na leitura (...) A cada dia da semana foi
trabalhada uma cena do ato I, (...)” (Kaiser, Renata. Primeiro Ato, Angicos/Idem. pags. 18 a 23)
“Dando prosseguimento à nossa Caravana de Investigação Teatral, partimos
para a execução da segunda etapa do nosso projeto, desta vez na cidade de Assú.
O objetivo é desenvolver uma exploração cênica sobre o segundo ato da peça Ricardo
III, de William Shakespeare. Na bagagem, levamos a experiência e o aprendizado
da realização da primeira etapa em Angicos e, a partir disso, a certeza de que
precisávamos fazer uma boa revisão em nosso plano pedagógico.” (Ferrario,
César. Pelas bandas do Piató/Idem. pags. 28 a 35)
Ferrario apontou resultados investigativos do
segundo ato e Fernando Yamamoto atos de
experiências à base do terceiro.
“Santa Cruz foi a etapa mais difícil e delicada deste projeto e, em
decorrência disso (e dos resultados que conseguimos alcançar), a mais
recompensadamente também (...) Acabamos por fazer um recorte do nosso universo
de trabalho (...) apenas a cena 9, que nos pareceu trazer um conflito mais
explícito (...)maiores possibilidades de provocar o jogo entre eles.” (Yamamoto,
Fernando. Entre a Cruz e a Espada/Idem. pags. 38 a 41)
De novo, Fernando apresenta respostas conseguidas, dessa
vez ao IV Ato.
“A chegada a Currais Novos, portanto veio cercada de uma grande
expectativa por parte de todos nós (...) Cheguei ao Seridó na quarta feira, já
sob uma enorme expectativa criada pelas notícias dos meninos durante os dois
primeiros dias de trabalho (...) criamos um jogo muito dinâmico entre os
grupos, no qual a história do Ato IV era contada. Claramente conseguimos, ao
final do projeto – ou suposto final, já que resolvemos criar um bônus em Natal,
com o Ato V – (...)” (Yamamoto, Fernando. O javali sanguinário no Seridó/Idem. pags. 46 a 49)
O processo do Ato V – Natal é apresentado por Marco França, o
ator que compôs a personagem chave de “Sua
Incelença, Ricardo III”. Aponta “Após quatro cidades, três traduções, uma média de oitenta alunos, alguns
muitos quilômetros percorridos, dezenas de “muriçocas” mortas e uma quantidade
imensurável de conhecimento construído aportamos, finalmente, em terras doces
de um lar por vezes distante: Natal.” (França, Marco. Ato V – Natal/Idem. pags. 52 a 58)
Esclarecida de forma pontual a pedagogia construtivista do espetáculo,
ainda há os bônus que complementam a passagem da Caravana, em
que outras “feras” lavram a impressão do projeto costurado. Ayra
Moabb Monteiro Pessoa, pedagoga de Angicos, apresenta o poema “Clowns
de Shakespeare em nossas vidas” (pags. 24 a 27); o ator e professor de letras, da Universidade
Estadual do Rio Grande do Norte, traz seu olhar sobre o ”(...)
sonhar e vislumbrar a magia do teatro(...)”, em "Para
Contar uma história" (pags. 36 a 37)
Há, ainda, o “Mão dupla” (pags. 42 a 45), texto do comunicador, agente cultural e secretário de cultura da
cidade de Santa Cruz até 2008, Iranilson Silva; Ana
Carla Azevedo, atriz do Grupo Empório Dell’Art, de Currais
Novos, se
expressa por “Aos Clowns”(pags. 50 a 51). A atriz Titina Medeiros, do
Grupo Carmin, convidada a participar da montagem investigada, escreve “Um
Shakespeare que me revela um Nordeste”(pags. 59 a 61).
Por fim, a reprodução de uma conversa franca, mediada pelas novas
tecnologias, entre duas gerações de pensadores e tradutores de Shakespeare. Um
bate papo virtual que reuniu Aimara Resende, presidente
do Centro de Estudos Shakespearianos (CESh), no Brasil, e Marcos
Barbosa,jovem
e premiado dramaturgo cearense, radicado em Salvador
e professor da UFBA. O tema, W. Shakespeare e sua obra Ricardo III, no
capítulo intitulado “fricções” (pags. 62 a 69)
(Sua Incelença, Ricardo III/foto: Pablo Pinheiro)
A Revista Balaio, uma experiência registrada de processos de delicada riqueza
à cena brasileira. Há muita gente pensando o teatro nacional de forma séria e
concentrada. O Grupo Clowns de Shakespeare, de Natal, RGNorte, possibilita,
ao público curioso e afim, um balaio de cultura trabalhada. E deixa
em seu rastro uma saudade alegre da cena ampliada. Evoé, belos artistas!
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