Das arábias de Portugal
por maneco nascimento
O Teatro Extremo, de Almada – Portugal trouxe
nova pérola para o diálogo com a Lusofonia estabelecida na cidade de Teresina. “Salamaleque,
uma história das arábias” juntou atenção no palco do Theatro 4 de Setembro, dia
27 de agosto, às 20h30, com uma qualidade invejável de exercício de ator solo.
Fernando Jorge Lopes reúne carisma, talento
traquejado, ótima comunicação pleiteada com a plateia e uma devoção declarada
ao palco e às possibilidades de representar bem, com uma alegria contagiante a personagem
construída. Consegue prender a assistência seja pelo histrionismo concentrado,
seja pela delicadeza de desenvolver a cura do espírito da recepção, através da
magia do teatro imbuída de fervor e ritual do prazer de encenar.
Nessa nova empreitada Fernando nos
apresenta um contador de histórias das arábias e suas variações culturais da
personagem, dentro da personagem, do universo das recontações de enredos
tradicionais orais. Tratada de forma despojada e com um risível que amplia uma
economia de linguística corporal e desenha um “exagero” limpo, discreto, que
componha o maior dentro do menor valorizado.
A Cenografia é composta de um biombo, na cor
natural da madeira, que serve de passagem às personagens com quem o narrador
interage, na fuga poética do dialogar no monólogo. Três cestos, que caracterizariam
para o ocidente baús das memórias e histórias, na dramaturgia das arábias,
desenhada por Fernando Jorge, os cestos guardam a contrarregra que o apoia como
mágico que tira da cartola um coelho.
Há o cesto de onde sai a tenda, armada no
deserto; o em que está a amada, a mulher do norte e o outro em que guarda a
cobra encantada. Um tapete e os adereços que ora saem do cesto, ou de detrás do
biombo e voltam guardados, quando já tiveram sua participação no enredo.
O
mais é um ator brincando de ser feliz e fazendo a felicidade prazerosa de quem
vê o contador de histórias, imbuído de personagens que são elementadas a partir
de um turbante, uma capa, uma barba, um bigode que vira sobrancelhas, ou um
traço definitivo de corpo e tônus acompanhados de uma roupa base de característica
emblemática.
A Concepção e Interpretação do espetáculo,
assinadas por Fernando Jorge, são de uma ação inteligente, de praticidade lúdica
muito eficiente e de um cuidado e dinâmica delicados e representativos, na apresentação
do fingimento convincente e alegremente pontuado à ciência do teatro.
O
Movimento do espetáculo, de tratamento facilitado por Afonso Guerreiro, cria
uma sintonia de atração do público de qualquer idade, por apontar vitória de
afinidade pontual com a dramaturgia experimentada.
A Sonoplastia, de Celestino Verdades e de Fernando
Jorge Lopes, pulula entre as histórias como que a inventar o enredo para o qual
foi investida. Conta ou complementa com toda graça o narrado.
O Figurino, de
Alice Rolo, uma segunda pele funcional e equilibrada sob o contexto da
narrativa que centra a arte no ator, mas que ilustra personalidade no que
veste. O Desenho de Luz, de Celestino Verdades, está na medida certa e parece
redomar os sentimentos e variações da contação de histórias e determinar a cor
da ação, sem perder o foco dinâmico das personagens repassadas pelo narrador.
A Direcção de Produção, de Sofia Oliveira,
fecha o ciclo equilibrado da estética, aparentemente simples, mas de cuidadosa
excelência do teatro, finalizado no ato do intérprete e sua energia de compor o
labor de encenar alegria compensada pela boa ideia.
Em 45 minutos, Fernando Jorge nos brinda com
qualificada práxis teatral, sujeita a virar lição de como se constrói a
personagem, com viés popular sem causar exageros, ou desvio do foco que é
contar a história e trazer sonhos e magias por prática de bem representar. Os
diálogos com a mulher do norte, um rosto branco, sem corpo, preenchido por um
grande manto que lhe cobre a cabeça é de uma sutileza bela. A extensão do manto
vermelho caracteriza o corpo (i)material que a fantasia propõe.
As falas suaves e os movimentos sutis da
mulher amada, quando se dirige ao marido, guardam a marca da submissão educada
e contida de desenhar o sentimento da mulher de povo da cultura árabe.
“Salamaleque,
uma história das arábias” uma deliciosa arte dramática eficientizada para
ganhar qualquer público. Fernando Jorge Lopes desperta alegria do menino que
aprendeu a soltar pipa no deserto.
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