Teatro de desopressão
“Todo Camburão Tem Um Pouco de Navio Negro”, da Associação
Artística Nóis de Teatro, de Fortaleza, Ceará, marcou pauta indispensável na
agenda do FestLuso 2016 – Ano Júlio, com seu teatro político, expressivo, de
identidade e pertencimento social de defesa cidadã e cultural de sobrevivência.
No transversal da cidade, comportamentos, fé no humano e
religiosidade, como representação de empoderamento na cena, à fórmula de
discutir o gargalo da sociedade e seus entraves de vidas corriqueiras, no eixo
das cidades visíveis, em detrimento das
invisibilizadas, é o espetáculo licenciado, em exposição dramático
expressiva pela dialética da cena do oprimido. O novo navio negreiro e os
modelos atualizados de opressão e desova dos herdeiros da Nau castroalvina .
A feliz apresentação de “Todo Camburão Tem Um Pouco de Navio
Negreiro”, aconteceu na porta do Theatro 4 de Setembro, no passeio que margeia a calçada da Casa de
espetáculos . Às 18h30, um elenco antenado e vigoroso repercutiu a história de
Nathanel, seu percurso anti heróico de quem nasceu com tradição do “erro”, numa sociedade brasis de negros, pardos, e negros, em que as desequidades impostas
determinam quem sempre estará sujeito à vertiginosa queda livre da Roda da
fortuna, que lhe coube como sorte.
Espetáculo pancada, interfluxa sincretismo religioso, música
de expressão das periferias brasileiras, discurso panfletário de revisionismo e
reparação das diferenças sociais e posição social de ilustração das funções de
opressor e oprimido, na construção social determinista brasileira.
Atualiza política, justiça,
polícia, tudo no mesmo cinturão nevrálgico de discussão, crítica e exploração
da natureza espírito de porco institucional, a que está submetida uma grande
parcela populacional, em sua maioria expressiva negra, no país.
Um drama apropriado da linguagem dramática de repercussão da
falha trágica do anti herói e catarse aplicada ao distanciamento crítico, “Todo Camburão Tem Um Pouco de Navio Negreiro” consecciona um elenco registrado e
tarimbado na práxis do teatro de rua, gerado na identidade de referências
augustoboalinas, que influxiona a personagem-público para dentro da narrativa e
a torna parte proativa do discurso apresentado, numa representação cênica realístico
de impulsionar o cidadão crítico da própria realidade.
Os interpretes Jefferson Saldanha, Doroteia Ferreira, Kelly
Enne Saldanha, Altemar Di Monteiro, Henrique Gonzaga, Amanda Freire e Maurício
Rodrigues revezam arte, dinâmicas, talento e energia alegre e contundente, ao
variarem em personagens que vão e vêm na tessitura do espetáculo que mastiga,
engole e joga fora a platéia, para que ela vire regurgito da própria condição
de sobrevivência, a partir da particular observação do outro, em si mesma.
Um conjunto de criadores que reúne Altemar Di Monteiro
(coordenação geral); Murillo Ramos (direção) e, de novo, Altemar Di Monteiro,
na dramaturgia e assistência de direção, em íntima parceria com a cenografia,
de Jefferson Saldanha; figurino expressivo, de Miguel Campelo; formas à animação-bonecos, de Carlos César, adereços, de Pádua Oliveira, e maquiagem, Kelly Enne Sldadanha, garantem um dinamismo quente e uma carpintaria de
vívida presença criativa e cena viva contemporânea e política.
O Coletivo Nóis de Teatro e o espetáculo “Todo Camburão Tem Um Pouco de Navio Negreiro” cumprem papel social, de arte e cultura, e papel
político de interagir estéticas que reverberem vida em comunhão com o fazer
artístico e olhar reflexivo.
“Todo Camburão Tem Um Pouco de Navio Negreiro” cumpre, eficazmente,
os papéis sociais a que está imbuído na construção cultural da
práxis cênica que realiza.
fotos/imagem: (Assoc. Artística Nóis de Teatro)
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