aprendizes do palco
por maneco nascimento
A Escola Técnica de Teatro Professor Gomes Campos cumpriu + um rito de
passagem de aspirantes a artistas da cena.
Na noite do dia 26 de junho de
2014, às 20 horas, no Theatro 4 de Setembro, foi finalizado o exercício de formação de técnicos em
teatro, categoria ator.
A prática de final de curso, uma participação em montagem. Os
estudantes exercitaram o aprendizado escolar na revisita de uma das obras +
emblemáticas da dramaturgia nacional, de expressão política, “Um Grito Parado no Ar”, de Gianfrancesco
Guarnieri.
Ao pagarem a disciplina Prática de Montagem, ministrada por Marina Marques, os alunos montaram cena em releitura da obra. A direção de espetáculo também é assinada por M. Marques.
A dramaturgia cenográfica do exercício de cena em "Um Grito Parado
no Ar" é simplória, mas funcional. Um quase camarim, sala de reunião, palco do teatro, espaço de ensaios e improvisações à construção da ação dramática. Mesa de
escritório, escada pirâmide, arara com figurinos expostos a serem usados, quando
a personagem solicitar, e cadeira, bancos, tamboretes de tamanhos diferentes e
objetos que tornam experimentação real a metalinguagem que a ideia original do autor sugere.
(Um Grito Pardo no Ar, da ETEAGomesCampos/foto Franklin Pires)
Há uma dramaturgia de cena que não recebe correspondência à atitude dos intérpretes. Parece um descomprometimento dos atores e atrizes ao expressarem entendimento só das franjas de representação das personagens de Guarnieri.
Um naturalismo que não representa nem a televisão de improviso, ou cinema doméstico, nem o teatro de primeira experiência, salvo quando aplicada a recepção acionada por imberbes aprendizes do palco.
Um naturalismo que não representa nem a televisão de improviso, ou cinema doméstico, nem o teatro de primeira experiência, salvo quando aplicada a recepção acionada por imberbes aprendizes do palco.
Há um entrecruzamento de falas que não conseguem coadunar comunicação eficaz. Uma talvez pouca compreensão do texto original, de caráter político reflexivo, breca a eficiência da comunicação e acentua uma inconsciente negação do que eficientizaria o discurso da obra. Gera, na resistência, uma fala inexpressiva, amadora e descontextualizada da história datada e da releitura que deveria ter melhor apreensão, enquanto mergulho de texto que aponta estratégias de sobrevivência em dias de chumbo.
Mergulhar nos contextos transversais de memórias e história do período da ditadura e em atos criativos de preservação da cultura e arte do Brasil de exceção, talvez tivesse dado algum cabedal para que os novos atores melhor entendessem do que estavam falando e dessem o salto do gato de pés descalços.
Enredo assentado sobre o metateatro parece não ter sido entendido pelos intérpretes, já que nem na possibilidade da metalinguagem criou-se aproximação de sua geração à do teatro de Gianfracesco. A juventude e inteligência dos novos articuladores sociais em potencial, entranhados nas novas tecnologias, não deram suporte a um mertalinguismo de cena e de atitude repercutida das próprias experiências fora de cena para espelho no palco.
As inflexões e intenções das falas das personagens, nas vozes dos intérpretes, truncam melhor compreensão à audiência. A disciplina de Técnica Vocal, ou educação da voz, matéria obrigatória na grade de Escola de formação de atores e atrizes, parece não estar cumprindo metas. Os aprendizes de palco detêm problemas que dificultam a limpeza da cena falada e das oralidades naturais de qualquer enredo dramático.
Vozes de língua presa, inflexões esganiçadas, ou que taquarizam as falas e racham o ar, na passagem pela ponte do palato e caixa sonora, pecam na sonoridade de alguns intérpretes. Um desmerecido distanciamento na cena, sem intenção técnica brechtiniana, enfraquece a construção da personagem e, no descuido de ator envaidecido metralha o texto e o encobre da liberdade de ser audível.
Os figurinos buscam entrosamento contextual e representam uma das margens de aproximação a dramaturgia de época. A atriz que alcunha o nome artístico a homônimo de Preta Gil, tem um "timming" declarável a caráter histriônico. O excesso de apelo ao riso fácil e direcional frágil à plateia do gargarejo, desgasta performance + centrada na ironia econômica e pragmática.
A pesquisa musical fica na média do contexto e perdeu melhor aproveitamento no enredo, já que a operação de áudio acabou atropelando a narrativa e emboscando uma limpeza da sonoplastia na trama que deveria encorpar a ação dramática.
A cena + plasticamente limpa é a do final do espetáculo. Os intérpretes sobre bancos, tamboretes e escada e, recortados por pinos de iluminação, figuram em planos de luz e sombras. Expressionizam estética de claros e escuros e vozes presas no ar do ato panfletário de resistência.
"Um Grito Parado no Ar", da turma de conclusão do curso técnico de teatro da Escola Técnica de Teatro "Professor Gomes Campos" mereceria um detido mergulho na obra de Gianfrancesco Guarnieri, para que a dramaturgia de cena apresentada pelos alunos quebre a leitura linear e não se detenha só nas rubricas de "Um Grito Parado no Ar" guarnieriano.
Histórico
"Um Grito Parado no Ar"
5/7/1973 - São Paulo/SP
Teatro Aliança Francesa
"Texto de Gianfrancesco Guarnieri, vinculado ao teatro de resistência, produzido por Martha Overbeck e Othon Bastos, em encenação de Fernando Peixoto. Um dos primeiros espetáculos que conseguem furar o cerco da Censura em plena ditadura, por meio de uma linguagem metafórica, que revela o inconformismo e a rebeldia característicos do período.
O espetáculo estreia quase simultaneamente a Botequim,
outro texto de Guarnieri, configurando as primeiras incursões do autor por um
estilo figurado no qual se fazem referências indiretas à situação social e
política do Brasil.
Um Grito Parado no Ar reflete o momento difícil que a
dramaturgia atravessa, desejosa de discutir problemas sociais, mas obrigada a
evitar alusões explícitas que pudessem levar ao veto da Censura (...) A peça
gira em torno de um grupo de teatro em seu processo de trabalho e ressalta as
dificuldades que enfrentam dentro e fora dos palcos. Enfocando três planos de
realidade, o diretor Fernando Peixoto descreve a estrutura do espetáculo; as
articulações existentes na encenação: 'Um diretor e cinco atores procuram
realizar um trabalho, enfrentando toda sorte de pressões externas; o trabalho está
sendo minado por uma infra-estrutura repressiva, que provoca uma crise de
consequências insuspeitas; a peça que este grupo está procurando encenar é
mostrada através de cenas isoladas, mas nunca totalmente definida. [...] noutro
plano estão os poucos momentos em que o diretor e atores conseguem vencer; são
mostrados exercícios de interpretação, laboratórios e improvisações, discussões
sobre os personagens. O espectador assiste ao processo de criação do ator. A
mística do teatro é desnudada. [...] No terceiro plano estão as entrevistas com
o povo, todas autênticas, gravadas nas ruas de São Paulo. Na peça dentro da
peça seriam entrevistas realizadas para servirem de material de estudo para a
criação de suas persoangens', 2 A ação de Um Grito utiliza-se da alegoria,
mostrar o teatro como um local onde se trabalha e se fabrica uma aparência da
realidade. Quando despojado de tudo, resta ao grupo de artistas somente um
uníssono grito final, símbolo da luta e também da sobrevivência em meio a
opressão reinante. " (http://www.itaucultural.org.br/)
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