A idade da vida
por maneco nascimento
Neste final de semana, 29 e 30 de março, o Projeto Circula Anônimos – Nordeste possibilitou agenda, na cidade,
através do Prêmio Funarte de Teatro "Myriam Muniz", na Categoria
Pesquisa - Montagem e patrocínio da Petrobrás. A peça “Anônimos” marcou borderô
expressivo na história e memória do teatro nacional, de cepa do teatro
nordestino, sim senhor.
Teresina recebeu o espetáculo
cearense “Anônimos”, realizado pelo Grupo Teatro Novo. A peça aconteceu na
Galeria do Clube dos Diários, às 19 horas, e foi uma grata surpresa ao público
da cidade.
Com dramaturgia de cena, de
Sidney Malveira, o espetáculo remonta enredos e narra vivências de
idosos em seu porto solidão. As personagens que ganham vida na história
contada reverberam velhinhos que dividem suas experiências de moradores de
abrigos com visitantes coptados da plateia.
A interação personagem/público amplia o
dialogismo proposto pela dramaturgia. Quebra a quarta parede e, ao tempo em que
a interrelação solidifica a reflexão da abordagem cênica, o coadjuvante
(público) acaba refletindo, intervencionalmente, o drama dos narradores
(protagonistas). A personagem busca o interlocutor na plateia e torna-o seu
confessor, ouvinte, ou aquele parente esperado que nunca vem em visita.
A cenografia é de uma
simplicidade rica de signos, no detalhe de objetos cotidianos das lembranças e
ou composicionais afetivos da construção da cena. Lençóis, varais,
pregadores, cavaletes de sustentação (alças pontuais da ponte ao céu
cenográfico) e as memórias dependuradas, presas, na corda da vida emblematizada
para dias de rememorar, ou esquecer.
(Malveira em cena de Anônimos/divulgação)
O palco iluminado doura os
cordões da vida, sobre a cabeça e em redor das personagens contadas, cordões estes
que recebem adereços da cena e vestem, de cor, velhinhos de perdidas ilusões,
que acham, ao recontar seus cotidianos, a ponte de espelho para refletir solidões,
silêncios e ruídos, a comunicação de atrair a atenção do sentimento dos
narradores com a identidade da plateia que coadjuviza a narrativa e encontra
identificação com as falas de memórias sociais.
Espetáculo para teatro da arte do
ator (Aderbal Freire Filho) se
instala no método do construtor das personagens (Sidney Malveira) que
interpreta três idosos, cada um com seu carisma, sua alegria e intenção de
nunca perderem-se dos receptores de suas histórias contadas.
Bem humoradas, econômicas, e com
perfis intrínsecos de reprodução fiel de alguém tão próximo do eixo familiar de
cada pessoa de qualquer plateia, as personagens são tão feitas de humanidade
vívida que colhem os espectadores à completa entrega e aceitação da mímesis
concentrada.
O ator, numa roupa neutra,
vai acrescentando um elemento corporal, e da alma da vida criada, um adereço e
econômicos detalhes de andar, rir, olhar, pausas de abocanhar o pensamento e
retomar a conversa e o faz com domínio que parece despretensão, mas emana afiada
técnica de atuar e convencer, de forma íntegra, na arte do convencimento.
Desenhos de gestos e vozes do
corpo, em Malveira, incrementam a riqueza contida, numa implosão materializada
de sentimentos quentes e povoam as vivências do ator/personagem para emocionar
e refletir a vida como ela é, na representação da vida espiada.
Sidney não só consegue ser muito
eficiente, mas espetacularmente defender estética e plástica cênicas,
fundidas na riqueza de economia de interpretar e distanciamento crítico na
razão do teatro, sem perder nunca a ternura, nem elaborar estratégias de
discurso demagógico.
A cada lance das personagens, uma
ação de construir a espacialidade que define a casa, expectativas, sala, quarto
e vida no teatro das sombras e sobras da solidão em que são encerradas as
memórias e dias arbitrados, pela ordem oficial impositiva, aos moradores do
abrigo de idosos.
A música, que compõe o espetáculo,
enreda uma partitura que amplia a compreensão da dramaturgia proposta e
desliza suave em densidade dramática para efetuar redenção e tempo de espera
das personagens. A iluminação discreta também reitera toda a plástica da
leitura afinada ao efeito dramático.
A metáfora das “vidas”
penduradas, dispostas numa caixa cênica que se formaliza, a partir de adereços
afixados por pregadores em varais, valoriza a exposição das memórias
apresentadas. Essa mesmas memórias encerradas, num labirinto, dedilham falta de
escolhas pessoais, ou escolhas feitas por outrem em detrimento dos anseios dos
velhinhos carismáticos.
“Anônimos”, nas vozes sociais reproduzidas por Sidney Malveira, tem
técnica depurada em dinâmico ato de reinventar o exercício de atuação à
tradição e modernidade.
Malveira guarda boas surpresas e
detém carisma e talento que o fazem dono da cena e idade do teatro vivo e arte
do ator. Contém plástica e estética trabalhadas na composição do
simples eficiente, mas especialmente cunha-se a um intérprete criativo, detido na
experimentação e experiência da vida, seja das suas próprias, refletidas, ou das
alimentadas pela arte do ator.
Expediente:
“O
Prêmio Funarte de Teatro "Myriam Muniz", na Categoria Pesquisa –
Montagem, com patrocínio da Petrobrás, possibilitou ao diretor Sidney Malveira
e Grupo Teatro Novo desenvolverem a pesquisa no Lar dos Idosos “Torres de
Melo”, em Fortaleza, e finalizar a busca com a montagem ‘Anônimos’".
A
Direção e Atuação, no espetáculo, é de Sidney Malveira, que detém ainda a dramaturgia do texto. A Supervisão de montagem é de Ricardo Guilherme; Assistência de Direção, Design e Vídeo, de Dryca Lima. A Fotografia, de Marcelo Brasileiro; Figurino de Thaís de Campos; Iluminação de Aldo Marcozzi e Cenário, Sonoplastia e Produção do Grupo Teatro Novo.
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