por maneco nascimento
“E eu sou do tempo em que Cristo só aparecia de costas em filme mexicano de cinema do interior! Hoje, em encenação de Cristo, Jesus é ator global. E fica dando adeusinho pros fãs! E a Susana Vieira já fez papel de Virgem Maria! Rarará! Hoje é tudo Cristo da Globo. Pode ser em Nova Jerusalém ou em qualquer lugar do Nordeste: é tudo Cristo global. Dá autógrafo, é crucificado e depois dá autógrafos! (...)” (Coluna do José Simão In Meio Norte/arte&fest. B/5, 09.04.2012)
O município de Bom Jesus do Gurgueia recebeu sua oitava versão de “A Paixão de Cristo em Bom Jesus”. Na 6ª. Feira Santa, 06 de abril de 2012, a partir das 18 horas, um grupo de atores idos de Teresina e atores locais reinvestiram seu talento à mímesis da morte e ressurreição do Cristo, filho do Homem.
A dramaturgia: o autor da nova dramaturgia, vista naquela cidade do interior, é Franklin Pires, também ator e diretor da encenação regalada aos olhos dos comuns e convidado (a)s. Para esta versão 2012, F. Pires trabalhou a visão do anjo decaído, Lúcifer. Da Gênesis, o autor retira discurso em falas de abertura da peça para construir o enredo, sob o olhar do desviado das hordas celestes.
A narrativa e influência direta do Decaído vão soçobrando palavras à boca das personagens e espalhando a trama que culminará com a descida de Jesus ao túmulo, mas também com a inexorável recuperação d’Ele, dos mortos, sem que sobre esse aspecto divino possa Lúcifer interferir. Franklin, inteligentemente, reinventa as repetidas histórias desse drama espalhado mundo a fora.
A encenação: diferente, atual, perspicaz e deslocada do lugar comum, haja vista dar-se em um platô em plano mediano de uma serra. Neste cenário natural, elenco e público se misturam e, no desnível do local, ganham charme e beleza da Paixão a quem escala o terreno íngreme para ver o objeto encenado.
O elenco: o coletivo concentra energia muito boa que só magia do teatro pode desempenhar. Pontos altos, a desenvoltura de Franklin Pires na pele de Lúcifer. Seu corpo e textos sincronizados dão beleza em qualquer momento da intervenção do Mal contra o Bem.
(Franklin Pires: Lúcifer/foto acervo: portal 180 graus)
O ator global, Guilherme Trajano, chegou e, preocupadamente, foi avançando em resultado. Cumpriu bem o papel e conseguiu com humildade e interesse apresentar maior “feeling” que outros “famosos” de anos anteriores.
Bid Lima, em sua economia e carga dramática assentada, compôs uma Maria tranqüila. Gleyciane Pires, Maria Madalena, acompanhou a colega em cena limpa e clara às duas importantes mulheres de Cristo.
Bruno Lima, o Judas, conseguiu finalizar um “traidor” muito sóbrio e com as inquietações naturais da personagem. Convincente sem estardalhaço. Nayara Fabrícia, a Salomé, tem corpo que fala por si só e o texto vem em complemento. Marcel Julian, maduro entre os apóstolos. Os D+ do corpo da encenação se afunilam para o resultado renovador de teatro a céu aberto.
(Apóstolos, no detalhe: Marcel Julian, Bruno Lima e Fernando Goldan/foto: divulgação)
A acolhida dos artistas: o elenco de Teresina, que segue à Bom Jesus, eleva-se em disposição e alegria contagiante àquela cidade. Dessa feita, a hospedagem deu-se no Hotel Gurgueia, sem serviço de restaurante depois das 24 horas. A alimentação do elenco convidado, feita fora do hotel, deu-se em restaurante de comida estradeira. Dividida entre o trânsito da BR e o pó do barro vermelho da área não pavimentada.
Quem pode comer d’outro menu, teve + sorte. Os desavisados, ou desprotegidos de orçamento próprio, conviveram, segundo pilhéria contumaz do elenco, com “frango quase piando” e “peixe de aquário”, entenda-se, quase se mexendo. Os percalços de sobrevivência não impediram que a encenação fosse espetacularmente profissional e bela.
As celebridades convidadas: numa coisa o Macaco Simão tem toda razão, há + efeito de celebrização e celebridades desfilando pelas Paixões nordestinas. E, creio eu, menos energia de atuação para efeito de fé e paixão ao teatro.
Pela encenação de Bom Jesus já passaram Thiago Mendonça, um de “Os Filhos de Francisco”, não o Santo, mas o pai dos sertanejos, que tinha um Herodes qualificado; Alexandre Barilari, um Judas chorão e Fernando Pavão, um “Cristo” + preocupado com a aparência e o penteado da peruca da personagem.
Guilherme Trajano chegou, viu e venceu. E compunha o judeu, não o romano. Muito branco e com a novidade de interpretar em terreno acidentado, herdou escoriações e feridas reais à pele para viver o seu Cristo, sem maquiagens dos estúdios de tevê. Depois pousou para fotos e autógrafos também. Antes esteve estritamente concentrado na personagem e foi sempre generoso com os colegas de cena.
(Guilherme Trajano: Cristo, de Bom Jesus/foto acervo: portal 180 graus)
José Simão, o “Macaco”, talvez não desconfie que, também ao Piauí, se importem personagens da tevê para as Paixões de Teresina (a do bairro Monte Castelo), Floriano e Bom Jesus. Nada contra celebridades, mas elas inflacionam o orçamento e, como vedetes das indústrias mass media, valem quanto pesam.
Sobra muito pouco ao ator local, que + trabalha pelo projeto e nunca pelo cachê que sempre ínfimo. + paixão pela arte, sendo bem romântico, que senso crítico à justiça do “empregador”, acerca do mérito da profissão de ator do teatro do Piauí à Paixão dos negócios e holofotes.
“E eu sou do tempo em que Cristo só aparecia de costas em filme mexicano de cinema do interior! Hoje, em encenação de Cristo, Jesus é ator global. E fica dando adeusinho pros fãs! E a Susana Vieira já fez papel de Virgem Maria! Rarará! Hoje é tudo Cristo da Globo. Pode ser em Nova Jerusalém ou em qualquer lugar do Nordeste: é tudo Cristo global. Dá autógrafo, é crucificado e depois dá autógrafos! (...)” (Coluna do José Simão In Meio Norte/arte&fest. B/5, 09.04.2012)
O município de Bom Jesus do Gurgueia recebeu sua oitava versão de “A Paixão de Cristo em Bom Jesus”. Na 6ª. Feira Santa, 06 de abril de 2012, a partir das 18 horas, um grupo de atores idos de Teresina e atores locais reinvestiram seu talento à mímesis da morte e ressurreição do Cristo, filho do Homem.
A dramaturgia: o autor da nova dramaturgia, vista naquela cidade do interior, é Franklin Pires, também ator e diretor da encenação regalada aos olhos dos comuns e convidado (a)s. Para esta versão 2012, F. Pires trabalhou a visão do anjo decaído, Lúcifer. Da Gênesis, o autor retira discurso em falas de abertura da peça para construir o enredo, sob o olhar do desviado das hordas celestes.
A narrativa e influência direta do Decaído vão soçobrando palavras à boca das personagens e espalhando a trama que culminará com a descida de Jesus ao túmulo, mas também com a inexorável recuperação d’Ele, dos mortos, sem que sobre esse aspecto divino possa Lúcifer interferir. Franklin, inteligentemente, reinventa as repetidas histórias desse drama espalhado mundo a fora.
A encenação: diferente, atual, perspicaz e deslocada do lugar comum, haja vista dar-se em um platô em plano mediano de uma serra. Neste cenário natural, elenco e público se misturam e, no desnível do local, ganham charme e beleza da Paixão a quem escala o terreno íngreme para ver o objeto encenado.
O elenco: o coletivo concentra energia muito boa que só magia do teatro pode desempenhar. Pontos altos, a desenvoltura de Franklin Pires na pele de Lúcifer. Seu corpo e textos sincronizados dão beleza em qualquer momento da intervenção do Mal contra o Bem.
(Franklin Pires: Lúcifer/foto acervo: portal 180 graus)
O ator global, Guilherme Trajano, chegou e, preocupadamente, foi avançando em resultado. Cumpriu bem o papel e conseguiu com humildade e interesse apresentar maior “feeling” que outros “famosos” de anos anteriores.
Bid Lima, em sua economia e carga dramática assentada, compôs uma Maria tranqüila. Gleyciane Pires, Maria Madalena, acompanhou a colega em cena limpa e clara às duas importantes mulheres de Cristo.
Bruno Lima, o Judas, conseguiu finalizar um “traidor” muito sóbrio e com as inquietações naturais da personagem. Convincente sem estardalhaço. Nayara Fabrícia, a Salomé, tem corpo que fala por si só e o texto vem em complemento. Marcel Julian, maduro entre os apóstolos. Os D+ do corpo da encenação se afunilam para o resultado renovador de teatro a céu aberto.
(Apóstolos, no detalhe: Marcel Julian, Bruno Lima e Fernando Goldan/foto: divulgação)
A acolhida dos artistas: o elenco de Teresina, que segue à Bom Jesus, eleva-se em disposição e alegria contagiante àquela cidade. Dessa feita, a hospedagem deu-se no Hotel Gurgueia, sem serviço de restaurante depois das 24 horas. A alimentação do elenco convidado, feita fora do hotel, deu-se em restaurante de comida estradeira. Dividida entre o trânsito da BR e o pó do barro vermelho da área não pavimentada.
Quem pode comer d’outro menu, teve + sorte. Os desavisados, ou desprotegidos de orçamento próprio, conviveram, segundo pilhéria contumaz do elenco, com “frango quase piando” e “peixe de aquário”, entenda-se, quase se mexendo. Os percalços de sobrevivência não impediram que a encenação fosse espetacularmente profissional e bela.
As celebridades convidadas: numa coisa o Macaco Simão tem toda razão, há + efeito de celebrização e celebridades desfilando pelas Paixões nordestinas. E, creio eu, menos energia de atuação para efeito de fé e paixão ao teatro.
Pela encenação de Bom Jesus já passaram Thiago Mendonça, um de “Os Filhos de Francisco”, não o Santo, mas o pai dos sertanejos, que tinha um Herodes qualificado; Alexandre Barilari, um Judas chorão e Fernando Pavão, um “Cristo” + preocupado com a aparência e o penteado da peruca da personagem.
Guilherme Trajano chegou, viu e venceu. E compunha o judeu, não o romano. Muito branco e com a novidade de interpretar em terreno acidentado, herdou escoriações e feridas reais à pele para viver o seu Cristo, sem maquiagens dos estúdios de tevê. Depois pousou para fotos e autógrafos também. Antes esteve estritamente concentrado na personagem e foi sempre generoso com os colegas de cena.
(Guilherme Trajano: Cristo, de Bom Jesus/foto acervo: portal 180 graus)
José Simão, o “Macaco”, talvez não desconfie que, também ao Piauí, se importem personagens da tevê para as Paixões de Teresina (a do bairro Monte Castelo), Floriano e Bom Jesus. Nada contra celebridades, mas elas inflacionam o orçamento e, como vedetes das indústrias mass media, valem quanto pesam.
Sobra muito pouco ao ator local, que + trabalha pelo projeto e nunca pelo cachê que sempre ínfimo. + paixão pela arte, sendo bem romântico, que senso crítico à justiça do “empregador”, acerca do mérito da profissão de ator do teatro do Piauí à Paixão dos negócios e holofotes.
Mas é Semana Santa. Jesus perdoou 77 vezes, porque o ator local não perdoaria os arroubos de pavões, vedetes, orçamentos encolhidos e descuido com os artistas que preenchem de sangue a Paixão?
O Teatro tem + de dois milanos. As caravanas passam, mesmo as da commèdie d’larte passaram. Há os que “ladrem como cães” e os que evoluíram da linguagem dos bichos, “irracionais”. Os teatros sobrevivem aos homens. E a montagem de Franklin Pires, “Paixão 2º. o Outro” também sobreviverá ao santo com pés de barro.
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