por maneco nascimento

Com texto do poderoso mago das penas expostas, Plínio Marcos, e direção de Silmara Silva, o que se viu foi um exemplar exercício da arte premeditada ao ato conspirador do universo que gera cultura de teatro eficaz.

Seis prisioneiras dividem a mesma cela e, à medida que se vai desenrolando a trama, vai-se cosendo o lençol de chita barata e desconstruindo a tessitura do molambo humano, presente no cotidiano de seis mulheres que, aos poucos, vão descobrindo que todas juntas podem ser fortes, mesmo que radicalizem o enfrentamento, pois não fazê-lo seria decretar a total invisibilidade, já que a morte social, já é presente, ou a morte física pode ganhar fôlego.
A partir da mancha surgida em uma das companheiras de cela, começa o início do fim da prisão. Ao descobrirem que uma colega está com a mancha maldita, vão percebendo que a razão da exclusão de uma significa, naturalmente, o afunilamento de todas à desgraça comum, o vírus do HIV que as visitou através da seringa coletiva do pico.

Do medo do contágio e constatação da doença hospedeira, em cada uma, definem que deixar-se à sorte do estado seria estarem alijadas da escolha da vida que lhes caiba. Na virada do jogo de dominador e dominadas, tornam-se algozes da revolução do sangue "sujo" a ser passado adiante.
O futuro está lá fora, do outro lado das grades, e deverá abrir flancos a uma nova ordem de nascido(a)s, a partir do contato da que será pioneira em passar adiante a mancha roxa.
Plínio Marcos, em sua sempre audaz e inteligente arte de discutir misérias humanas e cidades invisíveis, reverbera o drama da vida como ela é, nas periferias de gentes comuns, com suas mazelas, falhas trágicas e ciclo de reprodução, quase determinista, da vida real e da realidade que nos cerca a todos, mesmo que a neguemos.
Estocando a própria laceração Marcos reflete o bem e o mal sem julgamentos, nem maniqueísmo panfletário. Ajusta o cerco das ilhas comunicantes que arquipelaguam a sorte de cada um(a) e uma solução que seja a de continuar vivo(a), mesmo que delimitando o que, ou quem sobrevive à sobrevida que aspeie no novo giro da roda da fortuna dos velhos costumes expiados.
"A Mancha Roxa", na leitura facilitada por Silmara Silva, ressalta seis belas mulheres e talentosas a nada dever a ninguém. Débora Radassi, na pele da primeira a ser descoberta com a mancha, constrói uma mulher de frágil e delicado denso mergulhado no trágico de sorte condenada.
Edithe Rosa, a beata do presídio, acaba nas vezes da atriz com um libelo de exaspero e fé cega, que garante à Rosa um bom desempenho, em conformidade com o coletivo coeso que a Leitura propiciou.
Gessyvane Rubim, a carcereira, também não perde a fé na arte que assegura amor ao teatro. Salvo alguma perda da própria inflexão, em meio ao burburinho ruidoso das presidiárias, mas contém força de atriz e está contida na aritmética da prova dos nove.
Iarla Ribeiro, a grande surpresa na narrativa, por ter conseguido me persuadir a tanto que não havia percebido tratar-se dela, até que acabou a Leitura. Ao comentar com ela, de minha grata surpresa, me disse: "então surtiu o efeito". Iarla construiu uma companheira, da infectada, com uma corporificação e falas que nutriam saídas, da pele, feito suor. Muito eficiente.

Silmara Silva e Érica Anunciação fecham o Ciclo de ótimas atrizes reunidas. As meninas do Coletivo Piauhy Estúdio das Artes detêm essa força e disciplina de bem apresentarem qualquer personagem que lhes caia às mãos. Sabem aplicar força e impressões construídas no sabor de delicadezas e ciência artísticas.
Filhas, das forjas de Baco, Pan, Apolo e presente trabalhado às mãos de Hefestos e quem + conspire ações que "divinizam" a arte de bem representar, elas reiteram prazer de persuasão e arte do convencimento ao fingimento premeditado.

Débora, Edithe, Gessyvane, Iarla, Mayra, Silmara e Érica são show de presenças dramáticas e ênfase empoderada de ato cênico às falas sociais reflexionadas, através de Plínio Marcos.
Parabéns ao resultado. Impactante e esteticamente eficiente. Rende a boa arte da cena que por aqui se conspira.
Muito feliz com suas considerações Maneko Nascimento,Você que é para mim referência dentro do cerco teatral piauiense.
ResponderExcluirGratidão meu querido.
não por isso. saudações teatrais.
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