terça-feira, 30 de abril de 2013

Overdancem


Overdancem
por maneco nascimento

O dia 29 de abril, comemorativo à dança, foi uma overdança de manifestações de academias, grupos e organizações agremiadas de corpos que dançam. 

Palco da festa ao Dia Internacional da Dança: Complexo Cultural do Matadouro – Teatro do Boi, a partir das 18 horas. A linguística de corpos e anatomias distendidas cumpriram bem a pauta da noite e deram seu sangue em arte e cultura representada.

24 companhias de dança convidadas, 20 delas marcaram presença em seus estilos, pesquisas, ousadia e determinação em manter-se escrevendo a história e memória da dança da cidade. Expressaram sua arte significante e significada aos corpos falantes. Para curiosos, amantes, iniciados e iniciantes, mestres e professores, laureado(a)s e convidado(a)s, um sinal positivo abrilhantou a festa. Uma overdança qualificável.

Do repertório de apresentações, o Balé da Cidade de Teresina trouxe uma coreografia; a Escola de Dança do Piauí “Lenir Argento”, um número de criação em suas fileiras de repertório escolar. Escola Balé de Teresina, duas coreografias; o Balé da Comunidade apresentou três números. A APAE também se representou muito bem. O Balé Jovem do Piauí, esse veio com gosto de gás e viabilizou 11 trabalhos, distintamente de expressão e experimentação dos que dançam porque vivem sua dança.

O Cordão Grupo de Dança, com seus meninos e meninas energéticos, se representou em dois números e sabe porque sabe quando a hora é de dançar a própria experiência em arte continuada. A Báttali Cia. de Dança esteve para três momentos coreográficos, como também a companhia convidada, vinda de Lagoa do Piauí, Corpo Dança Movimento. A Cia. Cynthia Layana, em toda sua graciosidade e pesquisa da cultura popular brindou a festa em duas coreografias bastante significantes.

As meninas da Casa de Zabelê também fizeram seu número e, em seguida, foi a vez do Balé Popular do Piauí com uma pesquisa de arte e memória popular dançada. A Organização Ponto de Equilíbrio – OPEQ trouxe dois números. Um, pelo menos, merece comentário diferenciado. Para surpresa de alguns coreógrafos que ladeavam comigo a assistência dos espetáculos, sofremos um impacto ao vermos a organização apresentar coreografia do clássico. Crianças sem ponta, joelhos duros, nenhuma clareza ou orientação eficientizada à linguagem de tradição.

Um constrangimento a quem vê e um equívoco a quem está convencida de que pratica dança clássica. Que a OPEQ invista em linguagem do clássico, se entende bem, porque livre arbítrio de facilitar a dança, embora fora de sua tradição de moderno e contemporâneo aplicada, mas o resultado não era para demonstração pública. Pareceu ser a única “peça” apresentada que descaracterizaria o momento, mesmo outros resultados que parecessem elementar, não estiveram perto daquela inadequação do clássico.

Na sequência, O Grupo La Danza, com um número; Le Ballet Studio de Dança, com quatro coreografias; Só Homens Cia. de Dança, uma coreografia; a Academia de Balé Helly Batista, dividiu-se em dez números, se representou muito bem. A Academia Passos a Dois, em sua inovidade de dança de salão, trouxe um passo do que é seu; a All Street Songs, em sua fúria de dança em clip e corpos sincronizados no tempo da música midiática. Desempenho jamais desprezável. 

A noite encerrou-se com a Cia. Moviment Street, em dois números de virtuose para eixos e assimetrias de corpos em adequação ao palco “in ritm dance”. Bonito de ver a juventude em desempenho de sua crença à arte e cultura de identidade em coletivo.

Dia Mundial da Dança, no palco do Teatro do Boi, 54 olhares coreográficos demonstraram porque a cidade mantém uma tradição de dança a la exportação. Nazilene Barbosa, Roberto Freitas, Weyla Carvalho, Sidh Ribeiro, José Nascimento, Samuel Alvis, Marinalva Gamosa, Luzia Amélia, Irineuda Dias, Geiza Pinheiro, Socorro Bernabé, Cynthia Layana, Kiara Lima, Frank Lauro, Valdemar Santos, Kleo di Santis, Helly Jr., Marcio Felipe, Márcio Gomes.

Perderam a festa as companhias Edinalda Vieira, Studio de Dança Gisele Sousa, Horus Cia. de Dança e Cia. Art Dança (Francisco Moreno). Mas estavam presentes em movimento da cidade que dança porque precisa.

Aquela noite é que foi inesquecível, quer porque era um dia especial à dança, quer porque a cidade veio prestigiar o evento. Pelo menos 300 pessoas concorreram a um lugar na plateia do Teatro do Boi. Foi uma grande noite e o público resistiu até o fim. Três horas e meia de dança revisitada.
(artistas em cena de dança/foto: fmc)

Realizado pela Prefeitura de Teresina, através da Fundação Municipal de Cultura Monsenhor Chaves, o Dia Mundial da Dança teve a organização da Coordenação de Dança da FMC (prof. Dedé, Marinalva Gamosa, Shirlyanne Oliveira) que cumpriu não só o “mètier”, como fez um “trainning” para o FestDança 2013 que acontecerá em setembro.
(artistas em cena de dança/foto: fmc)

Overdancem, porque era Dia Mundial da Dança e todo o universo conspirou a favor de quem vive a dança na cidade.

"Reves 1, 2..."


“Reves 1, 2...”
por maneco nascimento

Em noite muito movimentada, o Complexo Cultural do Matadouro – Teatro do Boi recebeu artistas, público, colaboradores, parceiros, leitores e empreendedores do Projeto Revista Revestrés Literatura, Arte, Cultura e Algo Mais.

Edição Comemorativa de 1 ano de vida, da Revista, trouxe um público bastante significativo à noite do dia 27 de abril de 2013, a partir das 18h30. Casa cheia, gente dentro e + gente no trânsito de participar do evento promovido pela Quimera – Eventos, Cultura e Editoração LTDA.

Em espaço próprio à manifestação de arte e cultura, o Teatro do Boi faz sua parte e recepciona quem procura a Casa e, nessa noite do dia 27 de abril, o universo conspirou a favor. Os anfitriões da festa, Welington Soares, André Gonçalves, Samária Andrade, Luana Sena e Maurício Pokemon investiram-se das vezes de artistas-apresentadores para (in)formalizar o que já havia como sorte para dar certo.

Os discursos e falas de apresentação e rememoração acerca de um ano de vida da Revestrés deram um refresco, já naquele momento, do que deveria aguardar o público concorrente. O músico Beetholven e seu charmoso piano recepcionaram os convidados, a partir das 18h30. Os dez minutos de música indeletáveis.

No mapa de enredo dos espetáculos da noite, veio em seguida o Grupo Harém de Teatro, com um trecho de “Abrigo São Loucas ou Três Personagens à Procura de Um Aqué”, com Francisco de Castro, Fernando Freitas e Francisco Pellé. O riso esteve garantido.

Outros atos de arte em melhor parte seguiram-se com a Academia de Ballet “Helly Batista”, em três solos de clássico, dois femininos (Anne Julliethe dos S. Pinheiro e Maria Emanuelle P. da Silva) e um masculino (Gustavo Augusto B. da Costa). O “Clip Revestrés” deu um ganho de resultado estético e um banho de efeitos técnicos, do sutil impactante, e bastante equilibrados na edição de imagens e sons. Belo clip!

Também a manifestação de rua e liberdades da veia demonstrou seu show pop urbano - street dance, filosofia da pele. No seu melhor de rap quentinho, da hora, “A Irmandade” deu seu recado da poesia das periferias e de suas falas de intervenção cultural das sociedades naturais em seu cotidiano simples, mas político e emblemático. E não fez feio.

E para manter o gancho da poesia, Durvalino Couto Filho ditou poesia em arte de toda parte a poetas, ator, intérprete e literatura, feito cultura de apreensão e ato reflexivo na veia do artístico manifestado. Neruda também visitou aquela noite.

Roraima também disse “sim, eu sou Revestrés”. Tocou seus pop melodys, com sua característica de identidade e carisma, como só Roraima mantém, na terra que escolheu para plantar uma árvore, escrever uma canção e criar seus filhos. Filho do norte do país, é em nossa terra gentil que canta suas loas e tá nas paradas musicais que a cidade nos possibilita viver. E, para a Revestrés, afinou seu tom e som da onda em a boa brisa canta.

Wagner Ribeiro dispensa apresentação e seu Valor de PI então, é um negócio daqui, ó! Pesquisador da cultura popular e apaixonado pelas coisas e causos naturais da memória afetiva rural, Wagner Ribeiro é o cara quando recita, improvisa, conta uma história e também quando canta.

Cantor e compositor das coisas de nossa vida que precisam ser reverberadas, para que não se percam da história da construção sociocultural das cidades e memórias intangíveis, sabe do letrado. O Valor de PI(Beto Boreno, Wania Sales, Marcelo Campelo, et all), grupo musical que desenvolve, com colegas músicos e artistas da arte de se representar, tem valor de cheiro da terra molhada em dias de verão desejado. Sabe ser e sabe desempenhar a arte do artista popular revisitado. Também é Revestrés.

Quaresma e Thiago E. são artistas de validade até que se reinventem, porque por hora Validuaté já se nos basta e faz história musical na cidade. Fecharam as horas de atrações artístico-culturais, porque a noite era sábado no canal Revestrés – Ano 1.
(arte lançamento Revestrés 1 ano/divulgação)

Boas conversas, encontros de amigos, viver cultura e interagir a arte que se faz e que se quer manter em cena vívida, na Teresina. Essas sociabilidades foram pauta povoada em noite do dia 27 de abril, na Casa de espetáculos Teatro do Boi.

Em edição de aniversário de um ano da demonstração de ação cultural que a cidade, por vezes, nem vê, a Revista também abre discussão, na matéria de capa da bimestral Revestrés - março/abril 2013: “Cadê a cultura que estava aqui?”
(arte lançamento Revestrés 1 ano/divulgação)

Respondo eu. Talvez esteja fora do circuito comum do “bellepoquismo cultural”, pequeno burguês, que a cidade insiste em querer manter, como marca de expressão e representação artística, em contraponto ao diverso manifestado da socioculturalidade teresinense.

sexta-feira, 26 de abril de 2013

"brincando encima daquilo"

“brincando encima daquilo”

por maneco nascimento

A Organização Ponto de Equilíbrio – OPEQ em parceria com as companhias Báttali Cia. Dança e Companhia de Dança Cynthia Layana apresentaram, no Anfiteatro do Complexo Cultural do Matadouro – Teatro do Boi, dia 23 de abril de 2013, a partir das 17 horas, o espetáculo “Ringue Klauss Vianna de Dança Contemporânea”.

O Projeto de montagem envolveu a OPEQ e + o laboratório de dança, a partir das coreógrafas Cynthia Layana e Beth Báttali, na troca de fichas premeditadas. Tema de improviso delegado, entre as Companhias de representação iniciática, nesse mundo de signos à linguagem da nova dança.

Em concorrência ao Edital BNB de Cultura 2012, com parceria do BNDES, os artistas e suas representações, de cultura experimentada, manifestaram o objeto pleiteado junto às estatais que fomentam também negócios e mercados à arte e cultura de expressão contemporânea.

Como foi explicado ao início da liberdade cênica anunciada, o projeto se embasaria em repercussão da memória e história construídas pelo grande artista da cena da dança Klauss Vianna. No palco aberto, bailarinas e bailarinos desempenharam seu “mètier” de facilitações concretizadas a partir das provocações, de impulso improvisativo, facilitadas pelas coreógrafas enleadas no jogo. “Disputa” de performances de Báttali Cia. Dança versus Cia. De Dança Cynthia Layana.

Há um expressionismo de linguistica de corpos experimentados que chamam à atenção por alguma graciosidade feminina e a virtuose feminil dos corpos dos meninos que dançam. Numa proposta de afetação, aplicam mapeamento cênico em corpos que verbalizam intenções de troca de “farpas”, insinuosos insultos e reflexo de juvenilidade, ou defesa de tribos sócio-determinantes de territórios de ocupação. 
(arte Ringue Klauss Vianna de Dança Contemporânea/arte divulgação)

“bricando encima daquilo”, travam as Cias. de dança um “front” de apostas, em jogo de quem dá +. dão boa média de corpos vibrantes, em sentimentos de liberdades expressivas e juvenilidade à beira do “descompromisso” de tradição revisitada. Belos e belas expressões de vigor e tônus desprendidos em nome da dança a cunho contemporâneo.

Proposta provocativa a partir do mapa dramático encampado em “lutas”, por vezes, frenéticas e, noutras, de simulacro do desdém do um ao outro em passe que dancem... “dance, dance mais, dance sem parar...”, ou parem porque a proposição é de quebra de paradigmas, mesmo que no viés do velho paradigma representativo como identidade e força de memória preservada. A negação da aceitação indispensável.

“Ringue Klauss Vianna de Dança Contemporânea” dança na rua, na praça, no palco, na vida que espelha contextos específicos da “juventude que essa brisa....” dança. Meninos e meninas refletem a própria memória afetiva, em expressão de corpos escrevinhando seu tempo e sua aura rebelde, seu nome e sua história à nova dança, perseguida, porém ainda sem digerir o efeito simbólico e demolidor em que a linguagem se assenta.

É peça para maturar intenções e atenções estéticas de propósitos e apreender + domínio do discurso para não parecer só “brincadeira de criança, como é bom, como é bom...” 

sexta-feira, 19 de abril de 2013

Laboratório de Ópera

Laboratório de Ópera 
por maneco nascimento 

Casa aberta, arte e cultura pedem passagem. O Complexo Cultural do Matadouro – Teatro do Boi recebeu, nesse 16 de abril de 2013, às 20 horas, o espetáculo “A Vingança da Cigana”.

 Uma releitura para a Ópera jocosa de artista português que reúne o trabalho de alunos de canto da Universidade Federal do Piauí. 
(Partitura original de A Vingança da Cigana)

A Vingança da Cigana” é um divertido drama joco-sério que conta a história de oito personagens de classe média-baixa que se cruzam na região ribeirinha, em Lisboa. Contextualizado na época em que foi escrito, o texto aborda as relações entre classes, raças, profissões e namorados no final do século XVIII. É interessante notar a influência da cultura afro-brasileira no texto de Caldas Barbosa e a presença do lundu e da modinha na música de Leal Moreira. (release)

(Domingos Caldas Barbosa,autor do texto de A Vingança da Cigana/divulgação)

No palco, Luana Campos (a Cigana); Késsia Lopes (Lambisca), Gildomar Oliveira (Grilo); Lucas Coimbra (M. Pierre); Edivan Alves (Tarelo); Francisco Pereira (Cazumba); Marcos Vinícius (Chibante) e Juliana Lima (Camila) desenvolvem bem o laboratório perseguido. A montagem é envolvente e ganha corpo de tranquilidade na cena. Os intérpretes estão em bom tom, musical. Gracejam música e cena, dramático-jocoso, com um aceno de pequenos grandes feiticeiros na arte operística. 

(elenco de A Vingança da Cigana/divulgação)

A Cigana, de Luana Campos, domina o campo de encenação com carisma, desenvoltura vocal e, performance determinante, ao tempo de dramaticidade musical que o libreto solicita. Sua extensão, afinada, vocal, um deleite para ouvidos seguidores. Lê o destino do público, sem vacilar e coopera na recepção limpa do enredo apresentado.

(A Cigana em ação/divulgação)

A empregada, Lambisca, composta por Késsia Lopes apresenta o contraponto no diálogo com a patroa, Camila (Juliana Lima). Há uma cumplicidade da divisão de cena que as mantém em sintonia, seja quando estão no enredo doméstico, na visita da cigana e ou quando reúne-se todo o grupo da trama. A Lambisca é a intrusona e enxerida que participa no desenrolar dos amores permitidos.

(cena de A Vingança da Cigana/divulgação)

A Camila, de Juliana Lima, também tem desempenho de boa média. Consegue desenvolver canto e encenação com uma naturalidade já fora do intempestivo e exasperado. Atrai domínio gracejado da cena exigida.

 Os personagens masculinos, de contracena e de antagonismo libretado, também estão muito bem. Gildomar Oliveira (Grilo), o barbeiro do sítio, tem uma das melhores sintonias de expressões e domínio de espacialidade, em economia e humor apresentados. 

Lucas Coimbra, com seu M. Pierre também é bem definido na encenação; Francisco Pereira (Cazumba) detém marcas entre as falas (cantadas) e o diálogo com o barbeiro Grilo, com tempo de passagem limpo e sincronizado. Marcos Vinícius (Chibante) e Edivan Alves (Tarelo) completam o time masculino e vinculam o fecho de drama, cantado, com eficiência.

A ópera foi composta para a reinauguração do Teatro São Carlos, em Lisboa, em 1794, depois de ter sido totalmente destruído no terremoto que abalou aquela cidade em 1755. Leal Moreira foi convidado para Diretor e tentou inserir obras em Português num contexto de forte domínio da ópera Italiana. Além dessa obra, a dupla Moreira-Barbosa compôs também em português, no mesmo período, “A saloia enamorada ou o remédio é casar”. (release)

(cena de A Vingança da Cigana/divulgação)

“A Vingança da Cigana” sob o olhar do laboratório de ópera da UFPI consegue envolver e manter a atenção do público. Recupera, no coletivo apresentado, uma ótima demonstração de técnica, estética musical e cênica, performance operística qualificada e um arcabouço de energia, conspirando para bom resultado, a partir do esforço concentrado do elenco e corpo musical.

A Orquestra de Câmara da UFPI, sob a regência de Samuel Fagundes, em “A Vingança da Cigana”, está de parabéns. A música interpretada e executada é de delicada harmonia ao canto planejado. Dos trabalhos cênico-musicais que tenho acompanhado, este talvez seja o de melhor resposta que confluam o canto, música e movimentação cênica.

Nas montagens anteriores já havia virtuose musical e de canto, mas um vazio no empenho para ator. Dessa vez o elenco cumpre também, eficientemente, a função de ator/atriz, nos diálogos exigíveis de emendar as partituras do libreto encenado.

Em “A Vingança da Cigana” esse equilíbrio está sendo alcançado. Os intérpretes estão à vontade também na hora em que destrincham os textos falados no dialogismo da cena que varia no musical. Há um lampejo, bem distinto, do cantor(a) que também diz um texto sem ruídos de comunicação estéticos. Descobriram o caminho do fingimento, extensivo ao texto falado, e a eureka está na pauta executada. 

O Departamento de Música e Artes Visuais da UFPI vem desenvolvendo, a cada semestre, um trabalho de concertos, recitais e montagens de musicais e óperas, com intuito de divulgação da arte erudita no Piauí. A coordenação vocal e cênica de Deborah Oliveira e com correpetição de Daniela Cabezas para “A Vingança...” vêm confirmar um ótimo projeto de mágica musical em Ópera cômica que ganha vida quente.

Bela vingança essa da cigana da UFPI. O Teatro do Boi esteve orgulhoso em receber, pela primeira vez, um exercício de ópera. Teresina agradece a iniciativa da Federal.

terça-feira, 16 de abril de 2013

Ficha certa

Ficha certa
por maneco nascimento

O Grupo Harém de Teatro está em novas temporadas e novas fichas tiradas do jogo da cena premeditada. Abriu temporada nesse mês de abril, na Sala Torquato Neto - Complexo Cultural Clube dos Diários/Teatro 4 de Setembro, às 20 horas, com o espetáculo “Abrigo São Loucas ou Três Personagens à Procura de Um Aqué”, com texto e dramaturgia de Arimatan Martins.

A temporada de sexta, sábado e domingo iniciada dias 12, 13 e 14 de abril, segue nesse próximo final de semana, 19, 20 e 21 e finaliza dias 26, 27 e 28, com o tema teatro e política, na esteira da trilogia hareniana que prospecta, desde o ano passado, montagens de textos autorais. Do projeto, já estrearam dois vértices da trilogia: “Macacos me mordam – A Comédia” (teatro e ciência) e “Abrigo São Loucas...” (teatro e política). Para 2014 está planejada a estreia de “A Revolta das Barbies” (teatro e comportamento).

Em temporada nesse abril, “Abrigo São Loucas ou Três Personagens à Procura de Um Aqué” é peça que repercute o desenredo de três Marias (Maria de Castro, Maria Fernanda e Maria Francisca) que revivem as memórias de tempos áureos (à sombra das administrações de seus maridos, chefes do poder executivo local), enquanto preparam o primeiro encontro de ex-primeiras damas.
(Maria Fernanda, Maria de Castro e Maria Francisca/fotos: acervo do Harém)

O Harém já conhece o “mètier” de fazer rir. Entre o histriônico, a picardia e o humor cáustico, o escatológico e a comédia da crítica de costumes, realiza sua dramaturgia de lazer, entretenimento e fomentação do teatro de propósitos que vem perseguindo, há pelo menos 26 anos, desde que resolveu trazer o homem brasileiro ao centro da cena. Não faz feio, na média faz mídia e aposta nas respostas colhidas de seu público fiel e seguidor.
(Maria Fernanda, Maria de Castro e Maria Francisca/fotos: acervo do Harém)

Com “Abrigo São Loucas...” reinventa a velha fórmula hareniana de colher o riso e reformular a plateia do gargarejo, sem cair no lugar comum do riso pelo riso, fácil. Repete um mote, já de domínio da cena e de recepção de público, e vai à luta para não perder o fio da “meágua”. O texto tragicômico, de Arimatan Martins, não só é inteligente, mas venal quando o assunto é político para refletir os velhos costumes da sociedade brasileira de política fisiológica, nepótica e  de cultura de prevaricação.

O autor e sua dramaturgia tratam, de forma brincada, sobre temas que nem sempre ganham recorrência na cena local, haja vista os aldeões estarem presos aos costumes de fingirem amenidades e manterem-se no ciclo dos favores e jeitinhos brasis. A trama quebra as barreiras do cínico e das imodéstias oficiais e revela como seriam as reais fibras do coração, nos bastidores oficiais, dos negócios públicos da política da aldeia local.

As Marias  representadas por Francisco de Castro, Fernando Freitas e Francisco Pelé encarnam o melhor exemplo de como se mantinham os negócios, com recursos públicos, antes da Lei de Responsabilidades Fiscais. As ex-primeiras damas vivem das memórias do tempo em que corriam leite e mel das contas públicas até suas ações sociais "dedicadas" ao povo necessitado.

As composições das personagens estão bem distribuídas entre as identidades dos atores e suas características próprias, emprestadas as suas Marias.

Maria de Castro (Francisco de Castro) carrega consigo sua herança de berço e etnia colonial branca. Maria Fernanda (Fernando Freitas), a emergente, traz traços de cepa indígena e alçou status sócio-econômico às custas de um , talvez, passe de Cinderela do agreste e concursos de misses frutas regionais típicas. Maria Francisca (Francisco Pelé) é a representante das classes populares, ascendeu de família humilde, a afrodescendente, catapultada das periferias nacionais, tornando-se uma, agora, ex-primeira dama.

O enredo é desenvolto, dinâmico e muito, muito divertido. Dividem, em hipótese confirmada, um marido ideal, que morre e deixa-as com as dívidas e problemas advindos dos negócios escusos no serviço público rentáveis. Emanuel Andrade, o partner, enfermeiro, marido e defunto de cada velório, torna a viuvez das Marias muito + engraçada, quando representa o marido morto.

Maria de Castro consegue compor-se, através de F. Castro, a uma mulher com lapsos de muito rica, diva e heroína popular ao “mètier” habitual. Tira boas risadas da plateia. Maria Fernanda, transmutada à vida através do ator F. Freitas, está muito à vontade para os rompantes e gagues eficientes, marcas e silêncios impactados por máscaras tragicômicas e falas no toque do doce. Tem muito carisma e detém atenção concentrada da plateia que a segue com fervor, por conta da simpatia desvelada na pele da ex-primeira dama, emergente.

Maria Francisca, a de F. Pelé, está muito na dela e na onda histriônica do intérprete criador. Revive meneios e tiradas de efeito de riso certo. Tempo de falas, batata. Carrega consigo os vícios e virtudes do construtor da personagem, mas com eficiência de manter a cena quente e reverberar não só memórias da cena local, como reiterar seu teatro distanciado e quase no desdém ao maior esforço. Talvez marca de qualidade. Não compromete o conjunto, alia emenda ao ato funcional.

Cenas impagáveis do espetáculo são: os velórios dos maridos de cada viúva e a preparação do primeiro encontro de ex-primeiras damas. Cada uma delas com solo bem curtido e defendido como arte do ator e sua cena. Sagacidade de dramaturgia e práxis científica de teatro bem equilibrado.

O desfecho do espetáculo ganha a cena planejada durante todo o cerco preparado em“Abrigo São Loucas...”. Arimatan Martins, Francisco de Castro, Fernando Freitas, Francisco Pelé e Emanuel Andrade douram nova pérola aos palcos locais. Acertam o olho da mosca. Ri quem quer, torce o nariz quem nunca entendeu a linguagem hareninana, mas livre arbítrio é tarefa humana.
(Maria de Castro (Evita)/fotos: acervo do Harém)

O Harém de Teatro arbitra teatro vivo, “doelha a quem doelha”. Os riscos de repertir-se são da própria natureza e, como disse Pelé, a trilogia é o novo brinquedo do Grupo, depois voltará a fazer peças sérias. Agora é bater mulas rumo ao teatro praticado, no palco, sem tratados e teorias do fingimento. Só teatro pelo teatro, para gregos, troianos e aldeões da cena nacional. É ficha certa! 

segunda-feira, 15 de abril de 2013

Achados e achados


Achados e achados
por maneco nascimento

O Teatro Careta exportou, de Caxias para Teresina, nesse último domingo, 14, às 19 horas, e apresentou no palco do Complexo Cultural do Matadouro – Teatro do Boi, uma montagem de cena experimentada para comover e despertar identificação, ou não. Eu gostei.

Jean Pessoa, colega de palco e vizinho da gente, mora aqui do lado, (Timon), montou palco, em dobradinha com Maciel Mourão, também de terras maranhenses (Caxias), e brindou a cidade verde com “Aonde Está Você Agora?”. Um exercício discursivo da amizade, de dois jovens, conservada a custo do crédito na esperança e no reencontro da felicidade entre amigos.

“Aonde Está Você Agora?”, enreda Pedro e Gabriel, dois jovens que desenvolveram uma amizade, desde que tinham 8 anos de idade, na cidade de Vila Velha/ES, e se tornam grandes amigos. Do encontro na praia, gazeteando aula, enquanto crianças, a trama evolui para novas reuniões, em diversas fases da adolescência, até que o destino os afasta, provisoriamente.

(...) Apesar do abismo social que os separa, nasce desse encontro uma amizade verdadeira que sobrevive ao tempo e ao espaço. O espetáculo relata a vida destes personagens de uma forma simples, (...) não segue uma ordem cronológica, tornado-se um quebra cabeça para o público que se vê amarrado à espera de um desfecho (...). (release do espetáculo)

Desenredo romântico. Apontado, pelo Teatro Careta, como tragicomédia, a montagem aproxima Jean Pessoa e Maciel Mourão duma iniciativa de fazer teatro. Brincar de fingir, de forma séria, e abrir brechas para que o público recepcione a ideia, como melhor lhe aprouver.

(Maciel Mourão e Jean Pessoa/foto: divulgação)

Um tempo de cena pé dentro. Um texto comum, de história comum que reúne paixão, amor fraterno entre amigos e o risco de preservar amizade, mesmo que o tempo, as distâncias e adversidades separem as personagens, que um dia planejaram manterem-se unidas pelo sentimento de não se perderem um do outro.

Enquanto crianças, um já sonhava ir para Nova Iorque, tocar sua guitarra. O outro só queria poder ter uma bicicleta amarela para umas pedaladas e dividir sua vida pequena com alguém. Este o artista pobre e aquele o “rico” ingênuo. 

O de condição socioeconômica melhor, segue seu sonho, com a família, para a capital do mundo. O amigo pobre, fica sozinho, na velha vida comum, esperando a volta do grande companheiro de travessuras, que deve retornar, depois de sete anos, conforme o combinado.

O plebeu, já órfão de pai, depois perde, também, a mãe. Acaba envolvido com drogas e cadeia. O príncipe tem sua experiência novaiorquina e retorna ao encontro marcado, em dia e local estabelecidos. Nas cobranças e abandono e saudades, os amigos se recuperam em final feliz da boa amizade, sobrevivida ao tempo.

A cenografia, duas peças de tecido (malha) estão do céu ao chão do palco, esticadas, uma de cada lado, palco meio/frente. Duas velas de jangada que ilustram a praia e transformam-se em confessionário e ou outros ambientes de licença poética. Ao fundo a luz do sol recortada, no ciclorama (fundo), como emblema das mudanças de tempo e efeito tropical praieiro.

Nesse mapa dramático de praia, escola, Nova Iorque, quarto e solidão, “central park”, uma rua qualquer, cadeia, entre outras licenças teatrais, Jean e Maciel vão contaminando o público e engendrando reflexão para texto ingênuo, mas concentrado na humanidade reflexionada. 

Maciel Mourão, com registro vocal forte e limpo desempenha bem sua personagem e mantém presença na cena. A energia do máximo, contido, no corpo que nega e afirma. Jean Pessoa também se impõe para dividir calor de ator e domínio de fingimento e contrapõe, com o colega de cena, pequenos detalhes em corpo que quer e se fecha em copas da personagem construída.

(Maciel Mourão e Jean Pessoa/foto: divulgação)

Há um diálogo que se enfrenta e se completa. Dois atores acreditando no que praticam e, no esforço do convencimento, estão na média de + acertos.

Os figurinos, bem direcionados na pesquisa da juventude que essa brisa encanta, têm funcionalidade. Codificam os signos e siglas que a dramaturgia quer esclarecer. A agilidade com que trocam de roupa, também define a boa contrarregragem, contida na energia de contar uma história.

A luz, operada por Lucas Mesquita, é eficaz e define matizes do sentimento descrito pelas personagens. A operação de som, aplicada por Felipe, contém força de aliviar, ou transcender sentimento da pesquisa garimpada para o efeito desejado. 

Jean Pessoa e Maciel Mourão, entre achados e achados, não perdem chances de vibrar emoção da trama contada. Realizam o teatro da escolha, da densidade dramática, das intenções e extensões humanas de contracenar. São suas melhores respostas ao teatro que acreditam. Fazem com que se acredite também. E fazem bem.

“Aonde Está Você Agora?”, está onde a cena pede que o teatro sobreviva. O tônus da fé dramática reverbera talento e determinação desejados. Se é para comover, comove. 

E deixa, “Aonde Está Você Agora?, aberto ao público que possa digerir, quando apreender a lição, que um homem pode amar outro homem, sem que necessariamente estejam envolvidos, com outro sentimento, que não o da amizade entre dois bons e velhos amigos.

sábado, 13 de abril de 2013

"20 é poucos anos"


 “20 é poucos anos”
por maneco nascimento

A palavra imagem possui, como todos os vocábulos, diversas significações (...) figura real ou irreal que evocamos ou produzimos com a imaginação. Nesse sentido, o vocábulo possui um valor psicológico: as imagens são produtos imaginários (...) Cada imagem – ou cada poema composto de imagens – contém muitos significados contrários ou díspares, aos quais abarca ou reconcilia sem suprimi-los (...)({Imagem} Paz, Octavio. O Arco e a lira. Trad. Olga Savary. Rio de Janeiro: Noiva Fronteira, 1982. 368p. [Coleção Logos])

20 é número que beira à maioridade civil e, em se tratando de arte, sem perder o oficioso, é também tempo computado na licença poética, de existir e fazer memória de atuação à manifestação da dança local. 

O Balé da Cidade de Teresina, mantido pela Prefeitura de Teresina, através da Fundação Municipal de Cultura Monsenhor Chaves abriu festejos para o aniversário de vinte anos, em junho próximo.

(Só não falamos a mesma língua/foto: Kelson Fontinele)


A Cia. de dança moderna, nesse contemporâneo da linguagem visitada, mostra a sua arte em temporada no palco do Complexo Cultural do Matadouro - Teatro do Boi. O período, 12 e 13 de abril de 2013, às 19 horas. 

No cunho de também realizar ações que incrementem a dança, em caráter sócio educativo, de parcerias de cena, abre espaço em seu caminho artístico e inclui, na temporada, Cias. e academias da cidade, convidadas a engrossar os festejos.

No dia 12, sexta feira, antes da apresentação de “Só não falamos a mesma língua”, com coreografia de Nazilene Barbosa, o palco recebeu a turma da oficina de dança do TBoi, facilitada por Kiara Lima, com a coreografia “Embolada”. Inclusão de arte e cultura desempenhada pelo criativo e ascendente laboratório de dança da Casa.

A atração anfitriã, “Só não falamos a mesma língua”, bela peça de atenção e deleite de quem absorve poesia, através de imagens e corpos, em questionamento e ou transmutação de significantes e significados ao olhar da diversidade.
(Só não falamos a mesma língua/foto: Victor Gabriel)

(...) A imagem é cifra da condição humana. Épica, dramática ou lírica, condensada numa frase ou desenvolvida em mil páginas, toda imagem aproxima ou conjuga realidades opostas, indiferentes ou distanciadas entre si. Isto é, submete à unidade a pluralidade do real (...)" (Idem)
(Só não falamos a mesma língua/foto: Victor Gabriel)

Através da dança que desenvolve para linguagens e lingüística, de aproximação e apropriação, do meio em que está inserido, como sujeito de representação da dança, na cidade, o BCT também cifra sua condição humana por corpos que escrevem poesia, em seus meneios sincrônicos e assincrônicos coreográficos. E repetem, “Só não falamos a mesma língua!”

Nazilene Barbosa que provoca nos artistas do elenco, dessa montagem, a condição humana de discutir, refletir, desdobrar a identidade contida em cada um, aproxima realidades opostas, “indiferentes” ou distanciadas entre si. 

E, como abre sentido o cientista da linguagem, O. Paz, com incurso de submeter os estímulos e respostas à pluralidade do real, presente em cada um dos intérpretes/criadores e no público presente ao resultado do espetáculo.

“Só não falamos a mesma língua” é de práxis estética apreciável, divertida, com uma dose de humor reverberado nas silenciadas indisciplinas que ousam violar as regras. O diverso das individualidades confrontado com os signos das formas pré agendadas à convenção e fórmulas do sucesso tabelado.

O elenco que reescreve a dramaturgia planejada, através da lingüística dos corpos, está muito tranqüilo e em sincero deleite de repercutir “danço, logo existo”. Desloca-se, em sinais e emblemas simétricos e assimétricos, à partitura sentimental e dramatiza com eficácia, de entendimento e distanciamento, o objeto laborado.

Em espírito de Babel, conflui-se a obra mapeada à pluralidade do individual, em reiteração do bem coletivo de identidades espiadas e gracejadas ao efeito de crítica reflexiva do ser no outro, contido no eu apontado.

“Só não falamos a mesma língua”, mas se dança no universo do real comum a qualquer um, mesmo sob o signo do diferente apresentado.

(Só não falamos a mesma língua/foto: Kelson Fontinele)

Sábado, 13, o BCT repete a dose de “Só não falamos a mesma língua”, não sem antes abrir luzes também a iniciantes e iniciadas na dança. A coreografia “Cocaiando”, de Cinthia Layana, com as alunas da oficina de dança do Teatro do Boi, defende seu próprio ato para público curioso.

Balé da Cidade de Teresina e seus convidados são agenda necessária de ocupação da pauta cultural da cidade, no Teatro do Boi, às 19 horas. Quem não gosta de samba, pode gostar de dança e recorrer à agenda deste sábado, 13. Ainda dá tempo e a dança se garante. 

“20 é poucos anos”. O BCT sabe o porquê da sua dança. Seu histórico está na rua, na praça, no palco e na memória da cidade. Confere pra gente ver!

sexta-feira, 12 de abril de 2013

Paixão segundo C.L.


 Paixão segundo C.L.
por maneco nascimento

Uma mulher para amar, porque fiel a si mesma, a sua escrita, ao ser humano e a busca constante da paz do encontro consigo, com Deus e com os seus, não necessariamente só os de convivência doméstica, mas de todos que alcançasse com os olhos e sensibilidade solidária da escrita, cunhada com amor e necessidade vital de escrever e refletir a vida e o mundo em seu redor. Assim nos legou Clarice por Clarice.

Uma artista apaixonada pelos detalhes, apreendidos pelo olhar afinado em razão e sensibilidade à expansão de afoguear o outro, com sua energia, atomizando verdades e sinceros relatos das personagens de si mesma, de quem não quis calar-se e tornou-se um das + representativas autoras da literatura nacional. Do requinte, exercício da palavra, na difícil língua portuguesa, laborada para estar + perto do ser de “ser o outro dos outros”.

Suas falas, através de rica prosa, nos dão as falas das Clarices da Clarice Lispector que, aqui em Teresina, foram trazidas à vida, desta vez na cena, através de Beth Goulart, em“Simplesmente Eu, Clarice Lispector”, na curtíssima temporada, no Theatro 4 de Setembro, dias 10 e 11 de abril de 2013, às 20h. Para ritos e fora dos ritos, Clarice para Beth e Beth em Clarice, numa inesquecível apresentação para público concentrado e respeitoso em ouvir a autora em suas intervenções da “personagem de mim mesma”, como se definia.

(A Clarice de Beth/fotos: divulgação)

“Simplesmente Eu, Clarice Lispector” se instala na economia, de silêncios e ruídos de se fazer ouvir, em refinado de cores sóbrias do cenário, mescladas com outras de quentes detalhes e destacáveis, por vezes, dos figurinos charmosos de Beth Filipecki. O que parece esvaziar, ou melhor, neutralizar o cenário, preenche-o de presenças das linhas, entrelinhas e para além das linhas descritas na escritura claricelispectinianas.

O cenário (Ronald Teixeira e Leobruno Gama), de cortina em semilua que recorta e define o espaço de enredo das personagens e autora. Cortina, de cor branca, fragmentada em fitas que revelam e escondem a contrarregragem do teatro e magia representados e, na licença poética, redomam o sentimento do mundo das personagens e, ora são chuva, ora são a floresta em suas naturais sonoridades do Jardim Botânico. 

Complementam a cenografia limpa, um divã à direita, frente cena, conjugado com uma mesa de cabeceira (escrivaninha ou criado mudo); um “puf” (banco do Bondinho), fundo cena e uma poltrona, frente esquerda cena (espaço à entrevista coletiva à imprensa). Tudo em cor sóbria, mimetizando-se com a redoma, ao fundo, cortinada. Elegantes elementos cenográficos acompanham toda a estética revelada que impõe, somente, a presença das Clarices espiadas.

A iluminação, do piauiense Maneco Quinderé, fala por si só. Recorta, com sabedoria e delicadeza de matizes, os claros, escuros, as “penumbras” do espírito inquieto da mulher, que rompe o blackout, com a luz própria, da sempre exercitada hora da estrela. Caminhos desenhados, de luz, na geografia de filamentos frios e quentes, sem exacerbos de virtuose técnicos. + sensibilidade consentida e conspirada a universo já tão preenchido de lampejos inabaláveis de poesia em prosa rigorosa e simples do cotidiano traduzido.

A concepção, direção e atuação de Beth para Clarice, um brinde à felicidade da cena. E, se Deus não fosse invenção humana, como sugere a autora, também não se poderia deleitar-se com cena tão primorosa, já que também de invenção de artista do palco. Uma elegia ao texto literário, uma epifania à personagem construída da personagem feita objeto de reinvenção e releitura do real imitado. Dramaturgia apaixonada, mas nunca de fé cega. 

As coreografias e premeditados gestos (direção de movimento de Márcia Rubin), mímesis da paixão segundo C.L. à natureza humana, também presente em si mesma. A trilha criada por Beth e composta por Alfredo Sertã, em inspiração de Eric Satie, Arvo Part, Debussy e Lalo Schifrin, bela partitura, de especial melodia sentimental, na representação.

Aprimoram a narrativa, na estética de efeitos técnicos, o visagismo das fotos, de Rose Verçosa e o visagismo do espetáculo de Westerley Dornellas. As fotos de Fabian e de Lenise Pinheiro se representam bem. Fecha o ato técnico com Amir Haddad (supervisão de direção).

Beth Goulart não poderia estar + à vontade, pois revela sua paixão, desde cedo, pela autora e suas falas sociais, tão de identidade de qualquer um(a) que tenha topado nas linhas escritas por Clarice.

A atriz carrega consigo, num respeito de ritos, os sotaques das mulheres (preparação vocal de Rose Gonçalves), na mulher que se expõe, pela escritora sincera e honesta, a posterizar a mulher com suas falhas, rotinas, falas, medo, temores, amores, religião de negação e aceitação de Deus que nos povoa a todos. A paixão segundo B.G., um sincero elogio a mulher feita Clarice.

Do amor, à primeira vista, a atriz reitera calor, na dramaturgia desejada e feita obra, e contempla leitores e até aqueles que apenas conheceram Clarice, através de Beth Goulart, com um festejado talento de apreender, sem ofuscar obra e autora. Só corroborar a deixar + clara e cristalina a arte, em falas sociais, da paixão segundo Clarice Lispector.

Da personagem de si mesma, na voz de Beth Goulart, três pontos que definiram bem a artista e sua obra legadas à posteridade, mesmo que não buscasse tal posteridade, “amor aos outros, escrever e amor aos filhos”. E explica. Não amar o outro, a tornaria pessoa menor, mas amar os outros é ato necessário e inerente a si mesma. Escrever necessidade inegável, mas falha, porque nalgum momento, poderia desistir de fazê-lo. Amar os filhos, questão de dentro de própria natureza do amor contido nela.

(a Beth em Clarice/fotos: divulgação)

A Beth de Clarice, um luxo em ato sublime de uma à outra e da outra a uma. A Clarice de Beth, maturidade confirmada em fé religiosa, de dramaturgia espelhada na ciência do teatro. Da atriz à personagem (autora) e às personagens de alterego(eu literário), um confronto de arte, compreensão e entendimento de manifestar ato humano pela estética do fingimento. As mulheres, Delas, mergulhadas na humanidade de cada uma e, emergidas do fundo “Perto do Coração Selvagem”, para deleite do público fiel.

Ao final do espetáculo, a atriz agradeceu a energia da plateia, àquela noite, que possibilitou repetir o prazer de interpretar, + uma vez, Clarice Lispector. Ainda falou de perdão, de relações humanas, de prestar + atenção ao outro, à solidariedade, à educação aos filhos e respeito ao professor, falou de leitura, da nossa rua, nosso bairro, nosso mundo, do planeta que nos acolhe e fechou em lição de perdoar os outros, antes nos perdoarmos a nós mesmos, para se chegar ao divino.

Nem de longe, esteve fora do discurso da autora, contemplada esta com a experiência da atriz que também ama, segundo Clarice Lispector. Em epifania da personagem, durante um momento de narrativa dramática, a atriz/personagem repercutiu cantos de “Salmos de Davi”. Fora da cena, as falas da atriz reforçam o amor também de Beth, em reprodução da Paixão segundo C.L., pela humanidade observada.

Simplesmente Eu, Clarice Lispector”, senão um dos + expressivos monólogos da memória do teatro nacional, será um dos + significativos projetos vistos que envolvam literatura, em prosa, traduzida à cena sem prejuízos para intérprete, nem autora. Bravos!

Olhar legislador


Olhar legislador
por maneco nascimento

A Câmara Municipal rejeitou ontem projeto de autoria do vereador Gilberto Paixão (PT) que dava aos transexuais o direito de assinar o nome social em documentos vinculados à Prefeitura de Teresina. Ao todo, 12 vereadores votaram contra a proposta, dez votaram a favor e dois se abstiveram (...)" (Rejeição/Política/Diário do Povo do Piauí, 10 de abril de 2013, p.3[CS])

Para o parlamentar provocador da mudança, em benefício aos transexuais, a postura dos colegas vereadores foi de discriminação e preconceito.

 “(...) Gilberto Paixão afirmou que lamenta a decisão e que, para ele, o ato representa uma forma de clara demonstração de preconceito contra os homossexuais (...) Dos 12 vereadores que votaram contra, a maioria pertencente à bancada religiosa, composta por católicos e evangélicos – são eles o Major Paulo Roberto (PSD), Tiago Vasconcelos (PSB), Celene Fernandes (PTdoB), Cida Santiago (PHS), Pastor Levino de Jesus (PRB), Ricardo Bandeira (PSDC), Antônio Aguiar (PTB), Luís André (PPS), Dr. Pessoa (PSD), Valdemir Virgino (PTC), Teresinha Medeiros (PPS) e Joninha (PSDB) (...)(Idem)

Dos direitos democráticos, pode-se assertivar que todos têm seu direito, privado, de legislar em interesse que talvez passe por idiossincrasias, resistências naturais em cunho de educação familiar e religiosa, conceitos em pré apreensão que, talvez, se enviese, quem sabe, sempre dentro de princípios particularizados, salvo quando há entendimento que abra margem a divisar direitos + amplos, coletivos e dentro de uma ética de interesse comum à toda a sociedade, em sua diversidade.

Para o vereador Paixão, o colega major Paulo Roberto seria sujeito à crítica, por ser presidente da Comissão dos Direitos Humanos da Câmara Municipal e, para aquele, causa estranheza "'(...) o próprio presidente da Comissão de Direitos Humanos votar contra o projeto? Esse é o retrato que está se formando no país. Temos o Marco Feliciano na Câmara Federal e agora ele aqui’, desabafou ele.(Idem)

Enquanto isso, na bat-Câmara Federal, a novela continua de vento em popa, com enredo de resistências e de apoio ao pastor deputado Marco Feliciano, alçado a presidente da Comissão dos Direitos Humanos e Minorias da Câmara Federal (CDHM), dono do posto há + um mês, embora rodeado de protestos. Já tentou fechar sessão só para parlamentares e afins, sem sucesso. Já reabriu o livre trânsito, também aos manifestantes, para efeitos democráticos constitucionais, e enfrentou bate boca, defesas inflamáveis e resistências necessárias. Mas renúncia? Nunca! Não nesse mundo de deus racista e homofóbico a democráticos discursos de púlpito.

De seu porte, de escolhido, e olhar divinizado em posto de “eleito”, negociou ato político em resposta à reunião dos líderes dos partidos, com representação na Câmara, no último dia 9 de abril, em calor da busca ansiosa, dos outros parlamentares, de uma solução que abrace interesses + abrangentes da Casa, numa resposta à sociedade brasileira.

(...) Feliciano tentou negociar sua renúncia em troca da saída dos deputados João Paulo Cunha (PT-SP) e José Jenoíno (PT-SP), condenados no julgamento do mensalão, da CCJ (Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania) (...) Eleito no último dia 7 de março em reunião fechada por 11 votos dos 18 votos dos presentes, Feliciano foi escolhido por seu partido, depois de acordo firmado com as outras legendas que garantiram ao PSC o direito de indicar o presidente da CDH.(Direitos Humanos/Nacional/Diário do Povo do Piauí, 10 de abril de 2013, p. 8)
(M. Feliciano/foto: Alexandra Martins agência câmara)

Bom, se se tem condenados, em julgamento transitado do mensalão, ocupando cargos na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, é de justiça constituída e democrática cidadã que o pastor deputado mantenha-se, mesmo a contragosto da mobilização de artistas, políticos e da sociedade civil, à frente da presidência da CDHM.

Sobre acusações de homofobia, o parlamentar defende-se em seu direito, de livre expressão assegurada, e aponta que não tem nada "'(...) contra os gays, sou contra o ato e o casamento homossexual. Quero o lugar para poder justamente discutir isso. Vai ser debate. Vou ouvir e vou falar’, afirmou em mais de uma ocasião.(Direitos Humanos/Nacional/Diário do Povo do Piauí, 10 de abril de 2013, p. 8)

Confirmado e aceito o direito privado de posicionar-se, livremente, acerca de assunto que tem ganhado proporções de maior tolerância em outros meios sociais, de comunicação, fluxos de informação, formação de opinião e em espaços de legislar direitos comuns e coletivos, porque o mundo nunca foi unânime, graças a Deus! No Uruguai, Argentina, para ficar + próximo, o direito ao casamento de homoafetivos já está na pauta de arbítrio adquirido, através de seus parlamentos. Acompanham países como Holanda, Portugal, Canadá, entre outras nações + avançadas.

Por aqui, parece que ainda se terá que vencer uma luta entre o “bem” e o “mal”, “deus” e o “diabo”, na terra de maior população católica, “ameaçada” pelas fileiras obreiras de milagres e lotes divinos de pecha evangélica. Talvez, de um ensaio no front de “guerra santa tupiniquim” se consiga obrar o milagre da democracia plena e de direitos questionáveis, mas nunca encolhidos.

Assegurar direitos às minorias não será favor “divino”, nem serão estes engessados pela resistência de olhar “divininzado”. Será dever do cidadão, representante do eleitor, inclusive de minorias, olhar com ética, bom senso e cultura libertária e não prisioneira de direitos universais, modificados a novos contextos, porque as sociedades são dinâmicas e acompanham sua época e suas novas formações sociais.

Olhar divinizado, estreito, não serve a Deus, mas aos homens e seus interesses particularizados. Olhar solidário, sim, + próximo de Deus que deixa ao livre arbítrio o direito do homem(genérico). Não se vive + períodos de Deus vingativo, ou divinizados em seus impérios, monarquias e dinastias de “Ave”, “deus estelar” ou divindades politeicas, respectivamente. Esta é a era dos mortais, com suas falhas trágicas e (de)feitos comuns a mortais.

O olhar legislador também deve acompanhar solidariedade, inclusão, respeito ao direito do outro, seja de cor, credo, orientação sexual, ou posição política de natureza diversa, logo democrático.
Legislar em causa própria, ou de seus eleitos, talvez deforme princípios de liberdades consistidas e conquistadas a muito esforço concentrado. Democracia, direito de todo um povo, indistintamente. A “santos” e comuns.