por maneco nascimento
"Pau de Arara", do Teatro Careta, de Caxias (Ma), esteve preenchendo de alegria contagiante a noite do dia 18 de julho de 2014, durante a abertura da "VII Amostra Aqui Tem Cultura" , promovida pelo Grupo Utopia de Teatro.
A apresentação do espetáculo maranhense ocorreu na Sala Torquato Neto (Complexo Cultural Clube dos Diários/Theatro 4 de Setembro), a partir das 20 horas.
Maciel Mourão e Jean Pessoa realizam um doce deleite para causar boas gargalhadas e propor ao público que, livremente, não resista a uma boa dose de prazer possibilitado pelo humor, histrionismo popular e a simples ternura apresentada nas personagens que vão construindo a própria história, a partir de uma fuga de casa em busca do pássaro azul.
Texto e direção de Jean Pessoa enredam a vida de Gorete e Sardinha que, cansado(a)s de sofrerem repressão, repreensão, discriminação e preconceito, resolvem fugir durante à noite e, na beira da estrada, esperam a chegada do caminhão pau-de arara que as levaria ao eixo sul para vencerem na vida, ficarem famosas.
(Jean Pessoa[Sardinha]/acervo Teatro Careta)
Para Gorete, que sonha com a vida de estrelato, sua meta é fazer uma novela de Miguel Falabela e leva consigo, além da coragem, de seguir em aventura começada na madrugada da fuga, ainda a amiga, Sardinha, parceira de futuro desejado e trunfo de solidariedade por aquela que também sempre sofreu bulling e outras violências contumazes aos amigos gays.
É na espera do transporte que a peça ganha corpo de felicidade e arte do ator que brinca com naturalidade, verdade cênica concentrada e um toque especial de cumprir ritual de fingimento, sem cair no lugar comum da pilhéria fácil, embora a narrativa apresente situações comuns, jargões do memorial da oralidade intrínseca homoafetiva humorada. A construção da personagem que se nos é oferecida é para aceitar, sem resistir, porque embalada por sangue no olho e tempo de aprender a aprender a arte de encenar.
Maciel Mourão (Gorete) e Jean Pessoa (Sardinha) conseguem uma cumplicidade singular, na cena. A troca de textos, trejeitos, inflexões acertadas, entonações convergidas a silêncios e ruídos, da economia ao exagero, são um doce deleite de atuação. As falas e linguagens de corpo, da invisibilidade ao visível, trazem à luz da ciência do teatro e exercício do exercício, de persuasão e convencimento, em ato de bem interpretar.
(Maciel Mourão[Gorete] e Jean Pessoa[Sardinha]/acervo Teatro Careta)
Jean Pessoa, constrói um misto de patinho feio, a ingênua e comovente personagem, Sardinha, que muda de nome para tornar-se homônima de uma famosa cantora do Pará. Por trás do aparente gracejo de apelo popular, a sonhadora, defendida por Jean, emociona e prende a atenção do público não só pelo empenho particular do drama impregnado de histriônico expandido, como por imprimir força de efeito compensador da profissão, ao inflexionar intenções em detalhes e nuances de entendimento na construção da personagem. Só o grande prazer de encenar garante arte recheada de talento conquistado a fogo da profissão.
Maciel Mourão não fica atrás, no bate e rebate, da dramaturgia consentida com o colega de cena, derrama fervor de valorizar cada fala em atenção à intenção da personagem, que gere conflito, novidade e "maldades", no aquecimento da contracena.
(As amigas inseparáveis/acervo Teatro Careta)
A sua Gorete, ao se tornar Bionserete, um misto de Bionce com Gorete, avança para uma teúda que já vinha consequente na simples "mocinha" do interior. As tiradas e traquejos de cobrisses, do morde e assopra, que divide com a amiga de sempre, são de prolongar o riso que rouba da plateia.
O drama, que enreda Sardinha e Gorete, amplia fôlego quando elas resolvem vestir as roupas que trouxeram na trouxa de viagem e tornam-se a representação de suas divas, com o glamour que seus figurinos e sua noção de estilo possibilitam. Perucas, saltos e roupas celebrizam o novo perfil a ser apresentado na cidade grande, o sonho de conquista das ingênuas mocinhas da cidade pequena.
(As retirantes preparam-se para vencer na estrada/acervo Teatro Careta)
O texto, sempre uma novidade em picardias e surpresas, entre o delicado e o exagero da piada que escamoteia o pejorativo. Caracterizado, nas falas, pelo prazeroso encontro de dois amigos que dividem as memórias de infância, as pequenas traições de amores, infidelidade e mentirinhas jamais pensadas na relação entre Sardinha e Gorete.
O tempo dos atores, que compõem as personagens de "Pau de Arara", confirma a amizade que destaca o prazer de dividirem a cena. Generosidade, apoio e confiança, diálogo camarada e insutis estratégias de manterem-se amigos na cena, fora dela e retroalimentarem a arte de fazer teatro bem e sempre.
(Na espera do pau-de-arara/acervo Teatro Careta)
Maciel Mourão e Jean Pessoa dão ao "Pau de Arara" gênesis e expansão atomizada de teatro, aparentemente comum e de ação popular, mas definido como prática de ator e método na valorização de linguagem da comédia trabalhada ao riso e reflexão do objeto de riso.
Um pacote completo para garantir boas risadas e reiterar que o Maranhão tem teatro pra dar em doido pelo teatro de boa qualidade. Assim é "Pau de Arara" que garante a Maciel Mourão e Jean Pessoa um doce deleite quando o assunto é praticar teatro.
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