Fábula de Rua
por maneco nascimento
A Cia. A.S.S. de Dança e Teatro,
após cumprir agenda no FETLUSO 2013, dia 30 de agosto, às 10h, no palco do
Teatro do Boi, a uma plateia efusiva e considerável, também fez às vezes de
teatro a todos os públicos, na festa de aniversário de 119 anos do Theatro 4 de
Setembro.
Na programação da Casa de espetáculos,
a A.S.S. repetiu o infanto juvenil “Boa Noite Cinderela, na manhã do dia 4,
data emblemática que leva o nome do Theatro mais charmoso da capital. Com
Direção e Texto de Vitorino Rodrigues, a + nova montagem da Cia. repercute uma
reinvenção da fábula da borralheira, ou a + popular Cinderela, um dos ícones da
literatura universal infantil.
A dramaturgia de cena impõe à
assistência, com bom humor e juventude que a brisa encanta, um elenco que se
espalha numa versão da Cinderela para incursões em dança de rua, uma das
práticas já sedimentadas pela A.S.S. O trabalho demonstra uma nova operação
para a cena local que se sustenta na linguagem de apropriação e identidade
aproximada com seu público contumaz e curioso por novas entradas de dança e
teatro bem energéticos.
Numa divertida história da
borralheira e suas algozes, a madastra Eufrásia e as meio irmãs da menina,
Eulinda e Eudoxia, destaca perversas ações, enquanto correm no paralelo do
enredo os apoios poéticos e mágicos de Gorro, amigo imaginário da Cinderela, a
Fada Madrinha e o Príncipe que se apaixona pela bela forjada, e de encantos livres,
que desliza pelo salão do Reino de Opala aos sons rítmicos contagiantes da
batida da dança de rua.
Comédia infanto juvenil se
sustenta pela graça concursada de Laura Alexandre, na pele da Cinderela
ascendente. Laura mantém uma desenvoltura acelerada da personagem, mas incorre
na pequena voz aveludada e de registro imberbe que, por vezes, no apressado da
emoção acaba metralhando a compreensão da estratégia do riso que a dramaturgia solicita.
Mais tranquilidade no encenar e um freio na dinâmica célere, de composição da
personagem, diminuirá os ruídos da comunicação.
Raia Monteiro, compõe uma madrasta
empertigada e muito presente na cena. Boa projeção vocal, envolvida na
construção da personagem de índole má e perversa de signo universal da fábula.
Consegue uma performance bastante convincente e própria ao jogo de cumplicidade
e convencimento, com o público, que se persegue enquanto o drama corre.
(Raira Monteiro, a Mádastra de Cinderela/fotos: A.S.S)
Aliar a força, da personagem
conquistada, com um relaxamento ao humor, que a dramaturgia propõe, dará a
Raira um degustar da vida da Madrasta, + afinado, que já se impõe como força de
corpo e máscara em flerte com a dramaticidade em assentamento da fronteira do
bom fingir.
Márcio Felipe, como uma das irmãs
da Borralheira, carrega consigo um tônus já característico do ator. Tem boa
presença e humor para o permitido. Carismático, detém a atenção da assistência,
que não pode ser negligenciada.
(Antoniel, Laura e Márcio, Cinderela entre as meio irmãs/fotos: A.S.S)
Dosar o humor venal e perverso,
contido na personagem que anima e trazê-la a + demonstração de maldades de caso
pensado e dosado, deixará + claro o construído. Na economia de pensar a ação e
demonstrá-la, sem pressa de passar à próxima fase, terá tirado o pires de leite
do gato. Economia no monólogo interior e desfazer o histrionismo óbvio, para
encontrar o riso articulado, demandará a comédia sem apelos fáceis.
Antoniel Novais, como a outra meio
irmã da Cinderela, já está em processo de maturidade encenada destacável na construção
por ele proposta. Humor econômico, sem se perder nas facilidades de buscar +
risadas. Articula bem as falas e as traz carregada do simples, mas racionado,
de inflexionar intenções e converter as pequenas maldades em graves entonações.
(Antoniel Novais e Márico Felipe, as irmãs invejosas/foto: A.S.S)
A irmã invejosa, de Antoniel, ativa
sobre o enredo nuances composicionais que articulam brinquedo, entre o dócil em
figurada maldade e ações perversas com dedilhar de alfinetar a ferida, enquanto
dá um tapa e esconde a patinha de filhota da mesma ninhada. Seu antagonismo tem
humor pensado e o tônus corporal se estabelece para demonstração concentrada de
fazer rir e contar percurso do coletivo sugerido ao risível premeditado.
Vitorino Rodrigues, com sua Fada
Madrinha em rosa bombom, já se afirma por confrontar talento com mergulho nas
novas empreitadas e olhares de releitura da cena dramática. Consegue empatia
imediata com a plateia infantil, sem perder o foco nos pais dos infantes que
também ingressam no jogo licenciado da dramaturgia que o ator também assina.
(Laura e Vitorino, Cinderela e Fada Madrinha/fotos: A.S.S)
Desliza na cena com alegria e felicidade que harmonizam,
no enredo, uma figura de indispensável passagem. Uma fada de asa quebrada já
repercute um discurso da diferença e da aceitação da novidade, quer seja das
falhas trágicas das personagens, ou de imbuir dramaturgia de tradição em linguagem
contemporânea e de identidade com o street dance, traduzida ao contexto de
afirmação cultural e ato cênico. Defende e define leitura para novo degustar. Acerta
bem.
(Michael Douglas e Laura, Príncipe e Cinderela/fotos: A.S.S)
Michael Douglas encarna o belo
Príncipe com dedicação fluente, também divide exercício de ator para a
personagem do Gorro, o amigo imaginário da Cinderela. Preenche a cena com o
alegre do circo, da pantomima e do humor silencioso que ganha a plateia, de
surpresa. Converter-se em móveis utilitários da casa, como cabide, banco, define
um riso brincalhão das sketches na confirmação da fantasia brincada. Declara
amor ao teatro e se garante.
(Laura e Michael Douglas, Borralheira e Gorro/fotos: A.S.S)
Ainda compuseram a apresentação, de
“Boa Noite Cinderela”, Gabriel Silva, Lyvia Thaynara, Naldo Lazzar e Potrávio
Júnior. Compõem o conjunto que restringe, ao ato poético infanto juvenil, força
de atração e comunicação ativa com a plateia interativa e interessada em
intervir no destino da gata borralheira.
Os Figurinos de Aureni Oliveira,
da Figurino e Fantasia, significam a obra pensada e praticam o colorido e
emblemático do universo infantil das fábulas e contos populares universalizados.
Conta história apropriada na dramaturgia defendida. A Luz, de Tiago Borges,
também repõe força de ampliar a fantasia e o lúdico que “Boa Noite Cinderela”
integra na cena investida.
Márcio Gelipe, ainda acumula a
assinatura das coreografias empregadas no drama. Há um calor diferencial quando
a borralheira se transmuta à dançarina de street. O coletivo também embeleza a
fábula relida, ao demonstrar um “coletive street” na finalização do enredo.
Todo o corpo dança prazer em corpus frenético e ritimado. Quebra a tradição ao
dançar em gala tradicional de vestimenta, enquanto a coreografia se espelha
pela liberdade da dança de rua. Contagia.
(Elenco de Boa Noite Cinderela/fotos: A.S.S)
“Boa Noite Cinderela”, texto e
desenho de dramaturgia encenada, de Vitorino Rodrigues, encontra resposta
positiva na A.S.S de Dança e Teatro e registra repertório teatral para assomar
na cena local. Concorre para formação e reforço do público infanto juvenil, com
experimentada ousadia.
Afinar o coletivo planejado dará o toque de Midas que o teatro exige, mas já tem as mãos do mito reverenciado.
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