Somente Frida
por maneco nascimento
O Sesc Amazônia das Artes trouxe ao Piauí, dia 23 de agosto de 2013, no palco do Teatro João Paulo II, às 20h, o espetáculo “Solamente Frida” (AC), montagem da Cia. Garotas Marotas e o Teatro de Los Andes. Um teatro de peso e medida a proposta ousada e, carregado de acento dramático, para não fugir da carga particular da personagem expiada.
Espetáculo de imagens e signos fortes, de luzes tênues ou semi-luzes para caracterizar ambiente caliente de dores, amores, temores e desconstrução da personagem insistida em manter-se de pé, seja pelo mapeamento dramatúrgico construído, seja pela habilidade natural de concentrar a personagem construída pela atriz Clarisse Baptista.
Montagem do Acre, traz consigo um arrojado cuidado de cenografia e maquinaria eficiente para desfazer e reconstruir ambientações do cenário. Uma afinada sintonia entre Cenografia, de Gonzalo Callejas, Selene Fortini e Ed Andrade, e a cenotécnica e objetos de cena, assinadas por Gonzalo Callejas e colaboradores Selene Fortini e Wennedy Figueira.
Os trilhos em que parte do cenário corre; novidades que surgem manipuladas por cordas, ou presas a cordões a efeitos de títeres, tudo envolve o público pela matemática de rigor de cálculos que milimetram liberdade e prisão numa cena emoldurada.
O “oratório” em que está encerrada Frida, com peças detalhadas e outras que aparecem como numa mágica, enquanto a Iluminação, do Teatro de Los Andes, esconde o segredo da magia de mudanças de material da contarregra, já causa boa impressão em quem se deixa envolver pela cumplicidade dos truques de dramaturgia embutidos no enredo.
Toda a vida contada da personagem se passa entre o dentro e o fora do “oratório”, contido na caixa de pandora em que está encerrada a mulher. Ora Frida é narradora de si mesma, ora é peça exposta, ou guardada na moldura dentro da moldura. O cenário é desconstruído e reconstruído em voltas da memória e repetição do mito do eterno voltar, da morte para a vida e da vida para a morte.
As pesquisas para os ritos da cultura aos mortos, ou homenagens mexicanas à passagem, estão presentes na cenografia que tece a mora da personagem. Um altar erguido a início do espetáculo, com um ícone da artista plástica que, ao longo da encenação, sofre alterações, vai aos poucos sendo desmistificado e ganha vida nas representações realistas, surrealistas, expressionistas e impressionistas da personagem e seu cotidiano dentro da prisão a que sua vida e sua “morte” em vida a colheu.
Emblemas delicados e aureados pela iluminação dão ideia das siglas e signos que representarão a mulher, “a santa”, a profana, o mito Frida Kahlo. O espetáculo é aberto com uma imagem da narradora, em semiluz, para a qual só o rosto é recortado por ostensório econômico de iluminação, a esconder o revelado primeiro sinal de divindade. A coroa de luz em ostensório de velas ardentes, outra imagem plástica e surrealista da “santa”.
O Figurino, de Rodrigo Cohen, uma significativa mímesis da identidade particular, da artista plástica, repercute calor e serenidade conturbada que ilustram a alma da personagem, entre frágil e agressiva temperada.
Ainda da cenografia, a persiana vertical, recoberta de seda bordada, que separa os ambientes, entre o fora e o dentro do oratório, é muito refinada. Sem função óbvia, possibilita a quebra de espaços e reparação para novas, ou repetidas ambientações e dão uma dinâmica que parece compor a personagem dentro da tela, ou saltando dela para ver que efeito consegue da própria obra experimentada.
O altar dos mortos representa, ao mesmo tempo, as pedras do rosário de flagelo e penitência da mulher, arde em função prática, nada parece estar pelo ilustrativo simples.
(foto: facebook espetáculo Solamente Frida)
por maneco nascimento
O Sesc Amazônia das Artes trouxe ao Piauí, dia 23 de agosto de 2013, no palco do Teatro João Paulo II, às 20h, o espetáculo “Solamente Frida” (AC), montagem da Cia. Garotas Marotas e o Teatro de Los Andes. Um teatro de peso e medida a proposta ousada e, carregado de acento dramático, para não fugir da carga particular da personagem expiada.
Espetáculo de imagens e signos fortes, de luzes tênues ou semi-luzes para caracterizar ambiente caliente de dores, amores, temores e desconstrução da personagem insistida em manter-se de pé, seja pelo mapeamento dramatúrgico construído, seja pela habilidade natural de concentrar a personagem construída pela atriz Clarisse Baptista.
Montagem do Acre, traz consigo um arrojado cuidado de cenografia e maquinaria eficiente para desfazer e reconstruir ambientações do cenário. Uma afinada sintonia entre Cenografia, de Gonzalo Callejas, Selene Fortini e Ed Andrade, e a cenotécnica e objetos de cena, assinadas por Gonzalo Callejas e colaboradores Selene Fortini e Wennedy Figueira.
Os trilhos em que parte do cenário corre; novidades que surgem manipuladas por cordas, ou presas a cordões a efeitos de títeres, tudo envolve o público pela matemática de rigor de cálculos que milimetram liberdade e prisão numa cena emoldurada.
O “oratório” em que está encerrada Frida, com peças detalhadas e outras que aparecem como numa mágica, enquanto a Iluminação, do Teatro de Los Andes, esconde o segredo da magia de mudanças de material da contarregra, já causa boa impressão em quem se deixa envolver pela cumplicidade dos truques de dramaturgia embutidos no enredo.
Toda a vida contada da personagem se passa entre o dentro e o fora do “oratório”, contido na caixa de pandora em que está encerrada a mulher. Ora Frida é narradora de si mesma, ora é peça exposta, ou guardada na moldura dentro da moldura. O cenário é desconstruído e reconstruído em voltas da memória e repetição do mito do eterno voltar, da morte para a vida e da vida para a morte.
As pesquisas para os ritos da cultura aos mortos, ou homenagens mexicanas à passagem, estão presentes na cenografia que tece a mora da personagem. Um altar erguido a início do espetáculo, com um ícone da artista plástica que, ao longo da encenação, sofre alterações, vai aos poucos sendo desmistificado e ganha vida nas representações realistas, surrealistas, expressionistas e impressionistas da personagem e seu cotidiano dentro da prisão a que sua vida e sua “morte” em vida a colheu.
Emblemas delicados e aureados pela iluminação dão ideia das siglas e signos que representarão a mulher, “a santa”, a profana, o mito Frida Kahlo. O espetáculo é aberto com uma imagem da narradora, em semiluz, para a qual só o rosto é recortado por ostensório econômico de iluminação, a esconder o revelado primeiro sinal de divindade. A coroa de luz em ostensório de velas ardentes, outra imagem plástica e surrealista da “santa”.
O Figurino, de Rodrigo Cohen, uma significativa mímesis da identidade particular, da artista plástica, repercute calor e serenidade conturbada que ilustram a alma da personagem, entre frágil e agressiva temperada.
Ainda da cenografia, a persiana vertical, recoberta de seda bordada, que separa os ambientes, entre o fora e o dentro do oratório, é muito refinada. Sem função óbvia, possibilita a quebra de espaços e reparação para novas, ou repetidas ambientações e dão uma dinâmica que parece compor a personagem dentro da tela, ou saltando dela para ver que efeito consegue da própria obra experimentada.
O altar dos mortos representa, ao mesmo tempo, as pedras do rosário de flagelo e penitência da mulher, arde em função prática, nada parece estar pelo ilustrativo simples.
(foto: facebook espetáculo Solamente Frida)
Há cenas que beiram realismo expressionismo e
surrealismo para humor e drama sangrado. Receber um flagelo de pregos do
madeiro, ou deitar-se sobre estes e ser submetida a doses homeopáticas de ramos
da coroa Cristina, guardam uma licença poética para dramas e tragédias. Coroada
e deitada sobre a bancada do altar, feito corpo posto, ou a imagem do final em que a morta fuma
um cigarro, enquanto está emoldurada no altar das penitências, é de uma
plástica comovente e impactante.
(foto: facebook espetáculo Solamente Frida)
(foto: facebook espetáculo Solamente Frida)
Também gera comoção lúdica a perda dos filhos,
representada por massa amorfa, de pão, preparada, que não vingou. A
impotência da cria que não se sustenta, desfalece sobre as mãos e colo da mãe,
sem que a maternidade consiga dar forma vital ao nascido. Um transcurso ao transe e ao
natimorto, numa quase referência do caulim, matéria prima do criacionismo, em
que o “rebento” não consegue ser aborvido pelo sopro da vida.
As interpretações de Clarisse Baptista e Antonio Santoro mantêm um jogo nivelado de cúmplices da construção da personagem experimentada. A personagem masculina desliza pelo silêncio, economia e presenças por vezes furtivas, outras graves. Revela a alma da personagem do homem para perversidades amiudadas, fragilidades humanas e, em certo momento, uma prospecção impressionista à risco de tela finalizada.É o pé que falta à Frida desmoronada.
As interpretações de Clarisse Baptista e Antonio Santoro mantêm um jogo nivelado de cúmplices da construção da personagem experimentada. A personagem masculina desliza pelo silêncio, economia e presenças por vezes furtivas, outras graves. Revela a alma da personagem do homem para perversidades amiudadas, fragilidades humanas e, em certo momento, uma prospecção impressionista à risco de tela finalizada.É o pé que falta à Frida desmoronada.
(imagem: facebook espetáculo Solamente Frida)
Clarisse Baptista separa bem a narradora da
personagem. Deformada a alma da artista plástica, irradia o defeito para corpo
que fala, sem apresentar barulho que chame a atenção. Somente uma Frida, humana e convincente. O Texto de Clarisse Baptista e Alice
Guimarães, com colaboração de Juarez Guimarães Dias, sem pressa de desnudar a personagem, vai se
expondo entre o narrativo e o ato de mergulho no fundo do lago escuro da
pintora. Compete para boa comunicação.
A Criação, Encenação e Dramaturgia, mapeadas pelo Teatro Los Andes e Clarisse Baptista, têm função aristotélica e quebram paradigmas da tradição para metáforas significantes e significativas. Retornam ao teatro padrão e, em que tratem da morte como discurso e emblemas, não representam nunca dramaturgia de teatro morto.
A Direção, de Gonzalo Callejas e Alice Guimarães, doma a fera irascível que é Frida e conduz bom tempo para Clarisse Baptista. A Direção Musical de Lucas Achirico e as composições de L. Achirico, Kronos Quartet, Kroke, Luís Aguilar e populares completam a estética de “Solamente Frida”.
É uma Frida concentrada, de emocional dosado. Mesmo nos momentos mais exigentes para drama derramado, há uma qualidade de transferir a emoção ao corpo e coibir os exacerbos de sangue e inflexões verbais. Somente Frida é para Clarisse e Antonio e para propósitos apaixonados da Cia Garotas Marotas e o Teatro de Los Andes.
A Criação, Encenação e Dramaturgia, mapeadas pelo Teatro Los Andes e Clarisse Baptista, têm função aristotélica e quebram paradigmas da tradição para metáforas significantes e significativas. Retornam ao teatro padrão e, em que tratem da morte como discurso e emblemas, não representam nunca dramaturgia de teatro morto.
A Direção, de Gonzalo Callejas e Alice Guimarães, doma a fera irascível que é Frida e conduz bom tempo para Clarisse Baptista. A Direção Musical de Lucas Achirico e as composições de L. Achirico, Kronos Quartet, Kroke, Luís Aguilar e populares completam a estética de “Solamente Frida”.
É uma Frida concentrada, de emocional dosado. Mesmo nos momentos mais exigentes para drama derramado, há uma qualidade de transferir a emoção ao corpo e coibir os exacerbos de sangue e inflexões verbais. Somente Frida é para Clarisse e Antonio e para propósitos apaixonados da Cia Garotas Marotas e o Teatro de Los Andes.
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